Procedimentos que simplifiquem a vida de quem quer transportar podem ser uma ferramenta tão ou mais eficiente para a redução dos elevados custos logísticos do Brasil do que grandes investimentos em infraestrutura. É que o indicaram os participantes do painel Intermodalidade e Logística.
Para alcançar maior eficiência para a intermodalidade - transporte de uma mesma carga por diferentes modais - a palavra chave é: desburocratização. O exemplo de burocracia é o Canhoto - espécie de recibo em papel que precisa ser assinado pelo consumidor ao receber uma nota fiscal após o frete.
Cleber Cordeiro Lucas, presidente da Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (Abac), que reúne empresas que fazem transporte de carga por navios, contou que as companhias levam os contêineres com produtos industrializados para distribuir em todo o país. Mas o canhoto não vai no navio.
Como um só contêiner pode ter milhares de notas fiscais, os canhotos têm que viajar de avião porque eles precisam chegar primeiro que a carga e depois voltar a quem vendeu.
Cordeiro Lucas fala durante painel em que foram discutidas formas de desborucratização |
"São pilhas de documentações que temos que mandar por logística aérea", comentou Lucas. Ele pediu ao governo que incentive meios eletrônicos para reduzir os custos das empresas com a burocracia. "A carência de sistema torna [a logística] impraticável. Considero que essa seja a maior barreira de entrada a novas empresas no Brasil."
A explicação de Lucas foi para contextualizar críticas dele ao projeto BR do Mar - programa que o governo estuda lançar para ampliar a concorrência no setor de cabotagem. Segundo o presidente da Abac, o BR do Mar está focado em ampliar a frota de navios no país, sem considerar outros problemas no setor.
Presente à mesa, o secretário-executivo do Ministério da Infraestrutura, Marcelo Sampaio, reconheceu que o Canhoto é retrato do atraso do país e disse que o governo trabalha em processos de simplificação do sistema de transportes.
Sampaio citou como exemplo o Documento Eletrônico de Transportes (DTe), que está em testes e, quando implantado, vai fazer com que o transporte por caminhão deixe de levar 11 documentos em papel.
Segundo Sampaio, a dificuldade do governo é mapear o processo para entender o que deve de fato ser digitalizado e o que nem precisaria existir, para somente depois fazer a digitalização do procedimento.
"Não adianta digitalizar o processo burro", disse Sampaio, garantindo que o governo está empenhado em facilitar os processos para incentivar a intermodalidade.
A simplificação já começou, segundo o secretário, com a redução na criação de regras para o setor e na determinação de que haja menor intervenção do governo e das agências nas atividades privadas.
Ellen Martins, Superintendente da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), elogiou a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) por ter reduzido neste ano a quantidade de propostas que colocou em consulta pública para fazer parte de sua agenda regulatória, que são os temas em que a agência analisa criar regras, nos próximos dois anos.
A falta de regras adequadas e também de infraestrutura levou o vice-presidente da Confederação Nacional dos Transportes, Flávio Benatti, à conclusão de que o transporte rodoviário - responsável por transportar praticamente dois terços da carga brasileira - acaba sendo sacrificado para cumprir funções que não são as mais adequadas para esse tipo de modal.
"O transporte rodoviário acaba sendo sacrificado para cumprir as necessidades de abastecimento do país", afirmou Benatti.
Carlos Cesar Meireles Vieira Filho, presidente da Associação Brasileira de Operadores Logísticos (Abol), contou que, para quem opera logística é "pleonasmo vicioso" usar a palavra logística integrada porque não há como fazer de outra maneira. Apontando os baixos índices de infraestrutura de transportes no Brasil, Filho lembrou que também é necessário ampliar os investimentos nesse setor.
O Brasil investiu em infraestrutura de transportes na última década em média 0,73% do PIB. "É gradiente de zero. Para que haja investimentos do setor privado, o setor público tem que ser indutor", disse Filho, atribuindo a isso a matriz de transportes desbalanceada do país.
Elias Júnior, diretor do Ciesp-Fiesp, apontou que para sair da situação de baixos investimentos e alta burocracia, a técnica deve se sobrepor à política.