Médicos discutem em live os avanços na luta contra o câncer

Estimativas da OMS (Organização Mundial da Saúde) apontam um crescimento de 60% nos casos de câncer no mundo nas próximas duas décadas. Aumento da expectativa de vida, fatores ambientais, genéticos e estilo de vida estão relacionados ao surgimento da doença. Paralelamente, os avanços na pesquisa médica, com desenvolvimento de novos fármacos e tratamentos, tendem a aumentar a sobrevida e a melhorar a qualidade de vida dos pacientes.

Essas questões foram discutidas em uma live produzida pelo Estúdio Folha que reuniu André Abrahão, diretor médico da Novartis, Clarissa Mathias, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), e Angelo Maiolino, diretor da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH).

A íntegra da live pode ser assistida no site da Folha. Abaixo, um resumo dos principais pontos.

CAUSAS E TRATAMENTOS

Obesidade, tabagismo, sedentarismo e ingestão de agrotóxicos são alguns dos fatores de risco para o surgimento da doença. "O câncer é uma desregulação do sistema imunológico. É como se a gente tivesse uma grande fábrica que produzisse caixas brancas e lá pelas tantas, por vários fatores, produzisse uma amarela. Nosso sistema imune pega essa caixa amarela e retira de circulação. No indivíduo obeso, que fuma, que tem uma ingestão alcoólica abusiva, que não faz exercício, ou então que geneticamente não é programado para reconhecer determinadas alterações, a caixa amarela passa pelo controle de qualidade e vai se transformar em um câncer", explicou Clarissa.

Com o avanço da tecnologia e da ciência, a medicina personalizada se torna cada vez mais uma realidade, uma proposta de tratamento individualizada que se baseia em todo o histórico genético, estilo de vida e dados clínicos do paciente.

"A personalização da medicina é cada vez mais importante. Identificar os pacientes que são próprios para usar 'aquele' fármaco e que não vão se beneficiar de outros é muito bom. Identificando o paciente certo para o tratamento correto nós vamos acertar em um composto que o beneficia e também o sistema de saúde e vamos ter mais êxito. Não podemos dissociar tratamento de qualidade de vida", disse Abrahão.

As terapias modernas não substituem 100% a quimioterapia convencional, mas é preciso ter acesso ao novo, já que a maioria dos pacientes se beneficia de terapias combinadas, segundo Maiolino. "Na área da hematologia, houve um impacto tremendo [das novas terapias] no tratamento do mieloma múltiplo, dos linfomas e das leucemias agudas. [Os pacientes] passaram a se beneficiar muito de algumas drogas imunoterápicas e de terapia-alvo", disse Maiolino.

Já existem vários alvos moleculares que podem ser identificados por meio de testes. "O tumor é colocado em uma máquina e é possível fazer uma leitura daqueles alvos. Muitas vezes, atingindo um alvo se consegue controles da doença a longo prazo", explicou Clarissa.

A imunoterapia no tratamento de tumores sólidos em muitos casos permite aos pacientes uma qualidade de vida normal. Em casos de melanoma, câncer de rim e câncer de pulmão, por exemplo, um percentual de pacientes fica sem evidências da doença ou com a doença controlada, segundo Clarissa. "Estamos cronificando o tratamento do câncer. É muito mais fácil tomar um comprimido todos os dias, fazer uma aplicação de tratamento a cada seis semanas ou a cada quatro, que é o caso da imunoterapia, do que fazer uma quimioterapia, que tem mais efeitos colaterais", disse a médica.

PESQUISAS

Um fator fundamental para o avanço na luta contra a doença é investimento em pesquisa. A Novartis é uma das empresas que mais investiu em pesquisa e desenvolvimento nos últimos dez anos, disse Abrahão. São quase US$ 10 bilhões aplicados por ano no mundo inteiro e 306 projetos clínicos em andamento no momento, segundo o diretor médico da empresa. "Estamos falando de pesquisas clínicas mais adiantadas. Hoje a Novartis é a empresa que mais registra produtos no mundo. Não é só fazer a pesquisa, mas ter o compromisso de entregar um produto e discutir acesso para esses produtos no mundo inteiro", afirmou.

No Brasil, a Novartis investiu no último ano R$ 75 milhões. "São 58 projetos de pesquisas clínicas, 60% só em oncologia. Mas existem também outras áreas, como neurologia, reumatologia, doenças genéticas e cardiologia", disse.

"Como empresa, a Novartis se posicionou nas quatro maiores frentes em oncologia. Na imuno-oncologia, com seus produtos em andamento e ainda a serem lançados; na terapia celular, sendo a única empresa com estudo aprovado pela Anvisa, estudo esse já iniciado no Brasil; na terapia-alvo, com uma grande perspectiva; e também na área de radioisótopos, ou seja um fármaco que pode atuar em um alvo específico", afirmou Abrahão.

A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica acabou de lançar uma plataforma onde todos os pesquisadores poderão colocar suas pesquisas, segundo a presidente da SBOC. "A pesquisa abre uma porta para os pacientes, principalmente dentro do Sistema Único de Saúde, para uma medicina de ponta. Precisamos apoiar mais ainda a pesquisa clínica no Brasil para que nos tornemos cada vez mais competitivos", disse Clarissa.

O Brasil reúne caracterís ticas para ser um dos líderes mundiais em pesquisa clínica, concordaram os médicos. Não apenas pelo tamanho e diversidade da população, mas também por ter recursos humanos capacitados. "Os protocolos chegam ao Brasil, coisa que há 15 anos era uma briga tremenda para chegar. Agora somos convidados a participar de protocolos inovadores", disse Maiolino.

O entrave, muitas vezes, é o sistema regulatório, que precisa ser aprimorado. A aprovação de um pedido de pesquisa clínica precisa ter mais celeridade, equiparando-se aos padrões dos países desenvolvidos. Relatórios da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa) mostram que o Brasil participa em 1,9% dos projetos globais. "Nós teríamos condições de dobrar facilmente esse número nos próximos dois a três anos. Temos um composto muito importante para que o Brasil seja um hub de pesquisa clínica para a América Latina e para o mundo. Temos que lutar contra o entrave regulatório, que vem melhorando, mas ainda deixa o Brasil em defasagem com outros países", disse Abrahão.

ACESSO A MEDICAMENTOS

A pesquisa clínica também é uma via para que pacientes do sistema público tenham acesso a medicações que não estão disponíveis no SUS, a não ser em protocolos de pesquisa.

Coordenador de um comitê de acesso a medicamentos da ABHH, Maiolino disse que a entidade trabalha exaustivamente para que novas medicações sejam incorporadas no SUS, ampliando e tornando acessíveis as opções de tratamento. "Precisamos acertar o passo. Existe muita inovação, ela vem para salvar vidas de pacientes. O processo tem de ser mais acelerado", disse Maiolino.

"Inovação é a pauta do dia. Mas a pauta mais importante ainda é brigar pelo acesso, lutar pelo acesso do paciente. Defender a pesquisa clínica é um dever de todos nós", finalizou Abrahão.

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