Mesmo antes da confirmação do primeiro caso de Covid-19 no Brasil, no dia 25 de fevereiro em São Paulo, o Amazonas já agia para conter a chegada do novo coronavírus ao estado. Contou a experiência com outras síndromes respiratórias agudas graves que atingem a região nos meses de chuva, que vão de novembro a maio.
Em janeiro, com o avanço da Covid-19 pelo mundo, os trabalhos do Comitê Interinstitucional de Gestão de Emergência em Saúde Pública para Resposta Rápida aos Vírus Respiratórios foram reforçados e reorientados, seguindo as recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde).
"Nossas principais preocupações estavam na contenção da entrada do novo vírus no estado, por meio dos aeroportos e das fronteiras terrestres, e na capacitação de profissionais da saúde. Todas as pessoas que chegavam ao Amazonas com a suspeita de contaminação eram monitoradas. Começar antes permitiu que criássemos um plano de contingência, que mobilizássemos as equipes e tomássemos as medidas essenciais", afirma Rosemary Costa Pinto, diretora-presidente da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas.
Logo de início, o governo do estado definiu que o Hospital Delphina Aziz, na zona norte de Manaus, seria a referência para o tratamento dos doentes. Construído por meio de uma PPP (Parceria Público-Privada), o Delphina Aziz foi inaugurado em 2015 e é o mais moderno da região Norte. É o único no país a possuir o selo AQUA-HQE, certificação internacional da construção sustentável.
O hospital e pronto-socorro já conta com 50 leitos de UTI e tem capacidade para ampliar para até 350 caso sejam necessários.
Além disso, o governo do estado está usando a tecnologia para ajudar a combater a Covid-19. Foi criado um aplicativo para acompanhar o isolamento familiar de pessoas com sintomas leves e também daquelas que não apresentam sintomas mas tiveram contato com doentes.
Pelo aplicativo, a pessoa informa, por até 14 dias, se apresenta sintomas ou qualquer alteração em sua saúde. O app permite também que a pessoa converse com um profissional da saúde para obter orientação.
O mesmo app está sendo oferecido às pessoas que desembarcam no aeroporto de Manaus. "A aceitação está sendo ótima. As pessoas estão baixando o app e nos ajudando nesse controle¨, afirma Rosemary.
Também foi criado um call center, em parceria com a iniciativa privada e a Universidade Federal do Amazonas, em que especialistas tiram dúvidas da população em geral e também de profissionais da saúde que estão no interior do estado.
PESQUISA DE PONTA
É também no hospital Delphina Aziz que está sendo feita uma pesquisa sobre a utilização da cloroquina para o tratamento da Covid-19. Estudos com o mesmo princípio ativo estão sendo realizados em vários lugares do mundo, mas o estado do Amazonas já tem vasta experiência com o manejo do medicamento, utilizado para o tratamento da malária, doença que é endêmica na região.
"O governo do estado determinou que usássemos nossa experiência para testar aqui esse medicamento para o combate à Covid-19", afirma Marcus Lacerda, infectologista e pesquisador da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) no Amazonas e da Fundação de Medicina Tropical.
O estado do Amazonas foi pioneiro na obtenção de autorização da Comissão Nacional de Ética em Pesquisas, ligada ao Conselho Nacional de Saúde, para a realização do estudo com a cloroquina em pacientes graves.
A autorização saiu no dia 22 de março. No dia seguinte, iniciou-se o estudo com os primeiros pacientes. O grupo de Manaus pretende coordenar estudos em outros três centros: Niterói (RJ), Campo Grande (MS) e São José do Rio Preto (SP).
"É importante deixar claro que a cloroquina não serve para fins profiláticos no caso da Covid-19. A corrida às farmácias para a compra do medicamento foi um grande erro. Isso nunca foi recomendado por cientistas. Em nosso estudo, vamos testar em pacientes graves. Vamos estudar qual a dose mais indicada e também a toxicidade, além do resultado com a combinação com outros medicamentos¨, afirma Lacerda.
Diferentemente do que ocorre em outros lugares, a pesquisa no Amazonas irá utilizar a cloroquina produzida pela Farmanguinhos, da Fiocruz (difosfato de cloroquina). Outros hospitais pelo país passaram a utilizar a hidroxicloroquina, produzida por laboratórios privados.
"A pesquisa que estamos fazendo dará muitas respostas importantes à sociedade. Esperamos ter brevemente resultados para compartilhar com toda a comunidade científica", afirma Lacerda.
A experiência dos profissionais do Amazonas com a cloroquina e seu possível uso no combate à Covid-19 foi reconhecida pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, durante entrevista coletiva na semana passada. "O Brasil tem uma das maiores áreas do mundo de incidência de malária, principalmente lá da turma da Fundação de Medicina Tropical, de Manaus, que tem uma vasta experiência. São aquelas pessoas que sabem como ela [a cloroquina] se comporta", afirmou.