Da má fama à simpatia. Bastou um mês de isolamento social pelo coronavírus para o serviço de motoboys e entregadores se tornar imprescindível, e o reconhecimento da opinião pública chegar na forma de ações para a categoria. Grandes empresas de entrega se mobilizam para dar mais apoio aos seus prestadores, e o valor das gorjetas aumentou.
Lideranças de entregadores relatam crescimento da empatia com a categoria, tanto no trânsito, com os poucos que estão dirigindo, como, principalmente, no ato da entrega da comida. O santes "vilões das ruas"das grandes cidades passaram a ser vistos como trabalhadores que põem a própria vida em risco com a possibilidade de contaminação do coronavírus, apesar dos cuidados especiais adotados.
A empresa de entregas Rappi identificou um crescimento de 50% no percentual de pessoas que dão gorjetas online, feitas por meio do smartphone, aos motoboys. O Uber Eats informou que em 15 dias, desde o final de março, os usuários do aplicativo deixaram R$ 475 mil em bonificações, repassados aos entregadores, segundo a empresa.
No apoio direto, o aplicativo iFood divulgou que está destinando R$2 milhões a fundos solidários para ajudar os entregadores parceiros, sendo R$ 1 milhão para o fundo de proteção (para os que têm mais de 65 anos ou incluídos em outros grupos de risco) e R$ 1 milhão para o fundo solidário (entregadores com sintomas ou diagnosticados com a Covid-19).
O aplicativo Uber anunciou que o entregador diagnosticado com a Covid-19 ou que tiver quarentena requerida por uma autoridade de saúde receberá assistência financeira durante até 14 dias.
O iFood também criou um sistema de distribuição de álcool em gel para seus prestadores de serviço de 18 cidades no país. E disponibilizou por três meses um pacote de saúde em parceria com a AVUS para que entregadores cadastrados tenham acesso a uma rede de clínicas médicas, laboratórios e farmácias onde terão descontos de até 80%.
Outras ações dessas empresas também beneficiam comunidades carentes durante a pandemia. A Rappi e a ONG Gerando Falcões lançaram um botão dentro do aplicativo para arrecadar "cestas básicas digitais" para pessoas em situação de risco.
Em contrapartida, a categoria dos entregadores quer usar essa visibilidade inesperada para buscar formas de regulamentação da profissão. Os trabalhadores parceiros de aplicativos correm riscos no trabalho, agora agravados com a pandemia do coronavírus, já que não se enquadram em um a legislação efetiva no país.
"Nossa luta por melhoria nos ganhos, nas condições de trabalho e na relação com empresas de aplicativos de entrega já tem mais de cinco anos. O objetivo é que esses trabalhadores tenham um mínimo de assistência pelas leis do trabalho", diz Gilberto Almeida dos Santos, o Gil, presidente do Sindimoto-SP, o Sindicato dos Mensageiros Motociclistas, Ciclistas e Mototaxistas Intermunicipal do Estado de São Paulo.
Segundo ele, só depois de uma ação do Ministério Público na Justiça garantiu-se que as empresas de entrega distribuíssem kits de higienização pessoal e de equipamento no período da pandemia.
Passada esta fase, o setor espera que a visibilidade de hoje contribua para que o motoboy seja reconhecido pelos poderes públicos como uma categoria essencial e de risco, e "não como uma categoria de baderneiros como era vista até pouco tempo atrás", afirma Gil Almeida.