Sociedade tem chance de opinar sobre inclusão de medicamentos e tratamentos a serem oferecidos por planos de saúde

Sem atualização há três anos, o rol que determina as coberturas obrigatórias mínimas que devem ser ofertadas pelos planos de saúde aos seus beneficiários está prestes a ser renovado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A agência abriu a consulta pública número 81 no início de outubro para a inclusão de novas terapias e medicamentos que são considerados indispensáveis ao diagnóstico, tratamento e acompanhamento de doenças. Todo brasileiro pode participar da consulta pública, cujo processo é simples e online.

Segundo a ANS, estão sendo submetidas à sociedade 185 recomendações preliminares para atualização do rol, entre elas a inclusão de medicamentos biológicos para o tratamento de doenças autoimunes, como a psoríase e a retocolite ulcerativa, duas doenças inflamatórias e crônicas que até hoje não possuem qualquer opção de tratamento com medicamentos biológicos na saúde suplementar, embora já existam algumas opções disponíveis por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo a Federação Médica Brasileira (FMB), de 5% a 7% dos brasileiros sofrem com doenças autoimunes, quando o sistema imunológico do indivíduo ataca suas células saudáveis.

Dados da Anvisa apontam que, entre 2018 e 2019, foram registrados quase 1.600 novos medicamentos, entre produtos biológicos e insumos farmacêuticos no Brasil, sendo que, somente em 2019, 21 tinham indicação para o tratamento de doenças raras, um dado recorde.

Como o rol não é atualizado desde janeiro de 2018, nenhum desses medicamentos foram considerados para cobertura dos planos de saúde, deixando milhares de pacientes sem perspectiva de tratamento.

Daniel Durand, Diretor de Acesso da Janssen, enfatiza a importância da incorporação de medicamentos inovadores para a saúde dos brasileiros. "Ao longo das últimas décadas, a inovação dos medicamentos tornou possível tratar muitas doenças de forma mais eficaz. O resultado pode chegar à cura em alguns casos e, em outros, prolongar e possibilitar melhor qualidade de vida. Duas em cada três pessoas diagnosticadas com câncer hoje em dia sobrevivem por cinco anos, comparado com uma a cada três em 1964. Tratamentos mais eficazes não apenas devolvem a saúde do paciente mas permitem seu retorno ao convívio social, à escola, ao trabalho, o que tem impacto positivo na sociedade além de no setor da saúde", diz.

A participação da sociedade na consulta pública da ANS para atualizar o rol é de extrema importância, pois assegura a maior pluralidade possível em um tema fundamental para os usuários e para todo o setor de saúde.

A agência espera a participação tanto de cidadãos quanto de setores especializados, como associações de pacientes, sociedades científicas, entidades profissionais, universidades, institutos de pesquisa e representantes de classes.

Para Eduardo Calderari, diretor executivo da Interfarma, é preciso que o brasileiro tenha voz mais ativa e busque os seus direitos na área de saúde. "Ninguém utiliza um plano de saúde para ter apenas as mesmas coberturas e benefícios que o SUS já entrega. É preciso informar e conscientizar o brasileiro para que ele atue com responsabilidade para usufruir os direitos que tem", afirma.

A Interfarma é uma entidade que representa a indústria farmacêutica de capital estrangeiro focado em pesquisa e desenvolvimento, pool de empresas responsáveis por trazer ao mercado brasileiro produtos e tecnologias inovadoras. Segundo Calderari, a pessoa acaba descobrindo que não tem determinada cobertura em seu plano de saúde no pior momento possível, que é quando precisa de um determinado procedimento médico, diagnóstico ou medicamento.

Só que em doenças como o câncer ou doenças raras, por exemplo, muitas vezes o paciente pode não ter o tempo necessário para esperar por uma solução.

"Em tempos de Google, a pior situação é você saber, seja pelo aplicativo, seja pelo parecer do seu médico, que existe uma determinada tecnologia ou medicamento para o seu caso, mas descobrir que não tem acesso ao tratamento porque o seu plano não cobre o procedimento", enfatiza.

Para Calderari, o sistema de aprovação de novos medicamento e tecnologias no Brasil é muito demorado e está longe de acompanhar o ritmo da inovação das tecnologias em saúde. Ele defende que o Brasil, por meio da ANS, siga o exemplo de países como Austrália, Reino Unido, Espanha ou o Uruguai, entre outros, onde a inclusão de medicamentos acontece de forma quase que permanente, o que permite o acesso mais rápido da população a tratamentos mais modernos e eficazes. A Interfarma publicará em breve um estudo comparativo de como atuam 23 países nesse quesito.

"No Brasil, a inclusão de novas tecnologias acontece apenas a cada dois anos. Sendo que esta última, iniciada em 2018, em busca de aprimoramento no sistema e devido à pandemia, está atrasada mais de um ano. Um medicamento lançado em 2016, que por algum motivo tenha perdido a última janela para aprovação junto à ANS, está praticamente há cinco anos fora da cobertura dos planos, aguardando a avaliação."

Por isso, enquanto não evolui o procedimento e a metodologia para inclusão de novos medicamentos, é ainda mais importante que o brasileiro não perca a oportunidade de participar da consulta pública para exercer e usufruir dos seus direitos, diz Calderari.

Dedicando alguns minutos no site da ANS, qualquer pessoa pode participar da consulta pública, concordando ou discordando com a recomendação do medicamento do seu interesse e justificando com algum embasamento a sua opinião (veja no quadro abaixo como participar).

MAIS OPÇÕES PARA OS MÉDICOS

A inclusão de novas terapias e medicamentos na relação de cobertura dos planos de saúde dá aos médicos a opção de indicar aos seus pacientes um tratamento mais adequado, respeitando as individualidades de cada um e de cada enfermidade. A falta de tratamento adequado pode resultar em complicações, como no caso da advogada Kamila Rubia Fernandes Costa, que sofre de retocolite ulcerativa.

Por outro lado, uma troca de medicação pode significar uma melhora considerável na qualidade de vida de um paciente, como no caso do também advogado José Célio Peixoto Silveira, que convive há mais de 40 anos com psoríase.

Segundo o médico dermatologista Paulo Oldani, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia do Rio de Janeiro, os medicamentos biológicos já existem há cerca de 20 anos e desde 2009 o consenso da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) já recomendava a indicação do uso dessa classe terapêutica para pacientes moderados a graves da doença.

"Na década de 80, nós esperávamos uma melhora em torno de 50% dos pacientes com psoríase com os tratamentos disponíveis. Hoje [com os medicamentos biológicos], a gente espera melhora em torno de 90% a 100%, com pacientes totalmente livres das lesões", afirmou o médico.

Todas as propostas que estão nessa consulta pública foram amplamente debatidas em 27 reuniões promovidas pela ANS com a participação de membros da Câmara de Saúde Suplementar, os autores das sugestões e representantes de entidades do setor. Todas as reuniões estão disponíveis no site da ANS e agora é a vez da sociedade participar e contribuir no processo. Ao final da consulta pública - no dia 21 de novembro - as sugestões serão analisadas e consolidadas pela área técnica e será definida a nova lista de coberturas mínimas obrigatórias que irá vigorar a partir de março do ano que vem.

"A consulta pública está aberta para que as pessoas se manifestem e deem mais embasamento à recomendação da agência. Não foi batido o martelo ainda e quanto maior a contribuição, mais apoio ao processo", afirmou Oldani.

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