Combater o desperdício pode ampliar acesso à inovação

O acesso universal à saúde é um direito de todos os brasileiros. Mas esse acesso enfrenta crescentes dificuldades em várias áreas, especialmente na oferta de novas tecnologias de saúde e medicamentos modernos. Especialistas discutem a necessidade de encontrar modelos alternativos para financiar a inovação e fazer com que ela chegue ao paciente.

"Precisamos adotar medidas estruturadas de incorporação de novas tecnologias, como as parcerias com laboratórios privados, para gerar conhecimento e permitir o acesso rápido a medicamentos", afirmou Lucas Corrêa, diretor da consultoria Prospectiva, em palestra que antecedeu a mesa de discussões sobre Modelos Alternativos de Ampliação de Acesso a Medicamentos, na 3ª Jornada pela Saúde - A Blueprint for Success Brasil Summit 2020.

Os modelos alternativos de financiamento podem incluir, por exemplo, parcerias com o setor privado, flexibilização de regras para incorporação de novos medicamentos, priorização de linhas terapêuticas e intensificação do combate ao desperdício.

Na opinião da advogada Renata Curi Hauegen, da CuriE Consultoria, o Brasil já possui um arcabouço jurídico para uma aproximação entre os setores público e privado para o desenvolvimento de novas tecnologias. Agora é preciso testar maneiras de fazer isso funcionar. "As novas terapias e tecnologias vão alterar o curso de muitas doenças e será necessário discutir modelos novos de avaliação e precificação de forma embasada", diz ela.

DESPERDÍCIO

A discussão sobre formas de incorporar inovações passa por problemas que ainda precisam ser resolvidos, como o desperdício, para que mais recursos sejam liberados. "Somos muito negligentes com o desperdício. Há no país uma cultura do excesso de exames, por exemplo, que não beneficia o paciente", afirma o oncologista Stephen Stefani, presidente do capítulo Brasil da International Society of Pharmaeconomic and Outcome Research (Ispor).

Estimativa da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) indica que entre 20% e 25% dos gastos no setor têm alguma forma de desperdício. Esse índice é muito maior do que se gasta com medicamentos, destaca Sidney Clark, vice-presidente da consultoria global IQVIA.

Na opinião do médico oncologista Raphael Brandão, o sistema de saúde precisa lidar mais seriamente com o desperdício.

Segundo Brandão, para melhor prescrever exames e medicamentos, os médicos precisam entender as consequências de suas ações. "Se não evitar o desperdício, o sistema vai quebrar. Os sinistros aumentam, os pacientes mais simples deixam os planos de saúde e lotam o SUS. Os médicos precisam ter consciência disso."

ACESSO JUSTO

Modelos alternativos devem contemplar toda a jornada do paciente, acredita Tiago Farina Matos, diretor jurídico do Instituto Oncoguia, instituição criada para auxiliar pacientes com câncer. "Precisamos pensar em acesso justo, aquele que oferece o produto certo, na hora certa, ao paciente certo e com um preço justo", afirma.

Para Matos, é necessário garantir transparência na tomada de decisões, envolvimento da sociedade e formulação de regras claras de priorização. "Isso não é fácil. Mas nenhuma política pública nasce perfeita, por isso os gestores precisam ter a humildade para mudar as normas com rapidez quando necessário, sem apego", diz Matos.

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