Mudar para continuar no topo

Singapura é menor que a cidade de Registro (SP) e tem uma população que é um quarto da que mora na Grande São Paulo. Mas seu principal porto movimenta quase o quádruplo do que passa por todos os portos brasileiros somados.

Alguém poderá dizer que é uma questão meramente geográfica. Afinal, essa pequena ilha está numa posição privilegiada para ligar a megapopulosa e megaprodutiva Ásia ao resto do mundo. Não foi o que constatou a comitiva de brasileiros que foi a Singapura para conhecer o segredo do sucesso desse país e de seu sistema portuário.

A viagem técnica ao país asiático fez parte da programação da 17ª edição do Santos Export, e a comitiva era formada por congressistas, membros do Executivo e de entidades do setor e por empresários (leia depoimentos de integrantes na página 11).

Em visitas à PSA (que opera o principal porto do país), à MPA (autoridade portuária), a grandes empresas e a grupos de startups, os brasileiros constataram que a receita vai muito além da geografia e leva quatro ingredientes básicos: treinamento humano, investimento em tecnologia, busca incessante por soluções que elevem a produtividade e internacionalização.

O Porto de Singapura tem números superlativos. É responsável por 7% do PIB do país, está conectado a outros 600 no mundo, emprega 140 mil pessoas e recebe cerca de 140 mil navios por ano.

"O segredo é inovar sempre. A concorrência com o resto do mundo não permite que nos contentemos com o sucesso atual.", diz Tan Suan Jow, reitor da MPA Academy.

A MPA Academy e a PSA University trabalham no treinamento humano, voltado para os trabalhadores do porto. Desde 1962, já foram treinadas mais de 700 mil pessoas na PSA University.

Na ponta tecnológica, o Porto de Singapura caminha para a automação total. Hoje, cerca de 80% da operação já está mecanizada. A movimentação de contêineres, por exemplo, é feita por robôs. Humanos apenas acompanham, à distância, em uma sala de controle. Só agem na excepcionalidade de um problema. Já estão em testes também caminhões que rodam sem motorista.

Diferentemente do Brasil, onde os portos escoam a produção própria e recebem produtos para consumo interno, Singapura funciona como hub: 85% de tudo o que passa pelo porto não é consumido no país, apenas muda de embarcação com origens e destinos globais.

Apesar de toda essa eficiência, o Porto de Singapura está de mudança. As novas instalações (maiores e mais modernas) estão em obras. A área atual será destinada a comércio e apartamentos.

"Trabalhamos com embarcações e volumes gigantes. O transporte por contêineres é o que mais cresce no mundo. Daí a necessidade permanente de atualização", diz Ng You Yi, vice-presidente assistente da PSA.

Em visita ao Porto de Jurong (na região oeste da cidade-estado), a comitiva de brasileiros pôde ver ainda que, em função da atividade portuária, há toda uma indústria que impulsiona a economia do país, como a petroquímica, apesar de Singapura não extrair petróleo.

Outras empresas globais iniciaram suas atividades em torno do porto e se expandiram para outros negócios e para além das fronteiras do pequeno país. É o caso da ST Engineering, que atua em mais de 100 países, com negócios que vão da criação de softwares à construção de satélites, ou da CrimsonLogic, que desenvolve projetos de soluções digitais na área portuária em 43 países.

"Singapura carece de recursos naturais, mas apostou no planejamento e na internacionalização para crescer", afirmou Young Thiam Chong, presidente-adjunto da ST Engineering.

"É uma grande lição para o Brasil. Poderiam ficam acomodados com o gigantismo de seu sistema portuário. Em vez disso, investem em tecnologia e em capital humano e constroem uma economia que vai muito além do porto", disse o senador Wellington Fagundes (PL-MT), integrante da comitiva.

País aposta no uso intensivo de tecnologia

Inovação foi a palavra mais ouvida durante a visita da comitiva brasileira a Singapura. Tanto a PSA (operadora do porto) como a MPA (autoridade portuária) mantêm incubadoras e aceleradoras de startups que desenvolvem soluções para a administração de portos.

A PSA Unboxed existe há dois anos e investe US$ 40 milhões em ideias que vão moldar o porto do futuro ou porto 4.0, com muita automação, operações orquestradas, inteligência artificial e internet das coisas, sem esquecer da sustentabilidade. No MPA Innovation Lab, a pretensão é encontrar um novo Steve Jobs voltado para os portos, numa referência ao criador da Apple.

A MPA criou ainda, em conjunto com a Universidade Nacional de Singapura, o Pier71, também visitado pela comitiva brasileira. A função do Pier71 é estreitar as relações entre companhias marítimas e startups de tecnologia, permitindo que elas acelerem e ganhem escala.

Entre as soluções desenvolvidas estão ferramentas para facilitar transações financeiras, melhora na utilização de berços, otimização da mão de obra, rastreamento de contêineres e cibersegurança. "Eles põem em prática uma verdade que está muito clara para nós. A indústria portuária não será eficiente sem o uso muito intensivo de tecnologia", afirmou durante a visita Angelino Caputo, diretor-executivo da Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados (Abtra).

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