Descrição de chapéu tecnologia inflação

"Varejo vive o mais puro e irreversível darwinismo corporativo"

Para Carlos Capps, da IBM, pandemia fará com que modelos digitais rapidamente esmaguem concorrentes tradicionais

Ser ou não ser essencial definiu as chances de sobrevivência das empresas de varejo no início da pandemia, no começo de 2020. Um ano depois, isso não é mais garantia. Para Carlos Capps, vice-presidente e líder de indústria de varejo e produtos de consumo da IBM para América Latina, a palavra da vez é adaptação. Para o especialista, a crise provocada pela Covid-19 tem impacto permanente no comportamento humano e na dinâmica das indústrias, o que a torna ponto de inflexão na transformação digital dos negócios. Na sua opinião, modelos digitais devem esmagar concorrentes tradicionais no mais puro darwinismo corporativo. Leia a seguir a entrevista exclusiva que o executivo concedeu ao Estúdio Folha.

Carlos Capps, vice-presidente e líder de indústria de varejo e produtos de consumo da IBM para América Latina
Carlos Capps, vice-presidente e líder de indústria de varejo e produtos de consumo da IBM para América Latina

Quais foram os principais erros das empresas de varejo durante a pandemia?

Carlos Capps- Os desafios foram tão grandes e repentinos que talvez o maior erro tenha sido a inabilidade de detectar padrões de mudança e rapidamente ajustar ofertas, canais e operações. E isso vale não apenas para o início da pandemia, mas para todos os momentos de ruptura causados pela evolução da contaminação e pela imposição de novas regras. No início, houve um momento de sobrevivência, em que gestão de caixa, mudança para os canais digitais, continuidade das funções críticas, otimização da cadeia e relocação para o trabalho remoto foram muito críticos. Depois passamos por um período de otimização das cadeias em operações omnicanais [on e offline], variabilização das estruturas de custos e busca de uma melhora da experiência do cliente - que sofre também com a pandemia. Vivemos agora um momento de grande instabilidade, em que a flexibilidade das cadeias e operações para se ajustar com o mais rápido time-to-market na busca de novas ofertas de valor e novos negócios fará a diferença entre o crescimento ou a extinção. É o mais puro darwinismo corporativo.

Quais tipos de empresas conseguiram enxergar oportunidades e se adaptar rapidamente à situação para alcançar resultados melhores do que tinham até 2019?

Carlos Capps- Além do benefício de estar ou não operando com produtos essenciais, o sucesso dependeu do nível de prontidão tecnológica para ajustar rapidamente toda a cadeia de valor para as mudanças espontâneas de padrões de consumo e aquelas causadas pela imposição de novas regras. Notadamente, empresas com maior prontidão de captura e gestão de dados, análise avançada (advanced analytics) e flexibilidade de aplicações e sistemas conseguiram rapidamente aumentar a disponibilidade de estoques (próprios ou de terceiros) com maior poder de conversão. Essas empresas foram ágeis em mover a demanda da loja para o digital, transferir o contato com vendedores para novos canais de comunicação, escalar operações omnicanais, criar possibilidades de autoatendimento.

Como ficaram a experiência e a expectativa do cliente nesse período?

Carlos Capps - Inicialmente,a experiência do cliente piorou pela falta de prontidão dos canais digitais das empresas – da busca de produtos até o pós-venda. A maioria das empresas e das operações não estavam preparadas, e o consumidor aceitou a falta de informações, as entregas atrasadas e erradas, o custo adicional como parte de um grande problema mundial. Entretanto, as empresas mais preparadas rapidamente evoluíram seus níveis de atendimento.

"Agora, o consumidor subiu a régua e espera repetir sua melhor experiência de atendimento, independentemente de marca, canal, produto ou serviço."

Que tipo de tecnologia pode apoiar as empresas para superar esses novos desafios?

Carlos Capps - Destaco advanced analytics para captura de novos padrões de consumo e redefinições de portfólio, estoques e localização dos itens. A tecnologia ajuda a entender a demanda de produtos com redução de tempos de entrega e otimização de custos. Aplicações e sistemas modernizados em cloud também são importantes para agilizar a criação e a interligação de ecossistemas em marketplaces e a disponibilizar novas ofertas de serviços ligados a canais digitais, como autoatendimento, operações omnicanais, dark stores em uma cadeia estendida. Tudo isso em escala.

Você acredita que as transformações que o varejo vem sofrendo durante a pandemia são irreversíveis?

Carlos Capps - Não tenho dúvida. A pandemia foi um ponto de inflexão para a transformação digital e, mesmo que haja um retorno às condições pré-pandemia, o papel da loja e dos vendedores deve mudar, e o perfil do consumidor digital vai evoluir. Não é exagero dizer que estamos vivendo a transição para a nova era dos ecossistemas. Passamos da era das empresas que operavam por interesse próprio para a das empresas que orquestram operações com interesse mútuo, em jornadas omnicanais não lineares, que promovem contínua experimentação de novos modelos, produtos e serviços.

"O sucesso dependerá da velocidade de aplicação da tecnologia para melhorar experiências, lançar novas ofertas e repensar como o trabalho é feito em escala. Modelos digitais ágeis irão esmagar operações de concorrentes tradicionais."

​De que forma a IBM apoiou os clientes para resolver essas dificuldades?

Carlos Capps - Trabalhamos com nossos clientes desde as discussões e definições estratégicas até a implementação de protótipos ou soluções em escala, seja em modelos de operações próprias ou terceirizadas. Nosso ecossistema de parceiros e nossas próprias soluções (Infraestrutura, Cloud, Software, Services) permitem a transformação dos negócios de nossos clientes de forma acelerada e segura.

O que podemos esperar do varejo em geral e da experiência do cliente na era pós-covid?

Carlos Capps - Muitas transformações ainda surgirão. Localização e personalização multicanal, jornadas omnicanal ou omnimedia sem contato, utilização de voz, imagem, realidade aumentada ou realidade virtual para interação, “customer facing” remoto com detecção de emoções, autoatendimento com inteligência artificial são algumas delas.

Podemos dizer então que a pandemia foi um catalisador potente para a transformação digital do varejo?

Carlos Capps - Podemos dizer isso, mas é importante entender que transformação digital é mais do que tecnologia. Estamos falando sobre a necessidade de se tornar um tipo diferente de empresa e isso envolve um desafio muito mais profundo que é o de rearquitetar a forma como a empresa funciona e mudar a maneira como ela coleta e usa dados, reage às informações, toma decisões e executa tarefas operacionais. Acredito que, se abraçarmos e investirmos na compreensão, implantação e gerenciamento de novas estratégias e capacidades, alavancadas pela tecnologia e Inteligência Artificial, e se confrontarmos honestamente a transformação cultural e de liderança que isso requer, a nova era pode levar ao crescimento sustentável e a grandes oportunidades para instituições novas e inteligentes.