Regras antigas e excesso de burocracia não devem inviabilizar economia digital, dizem especialistas

Emiliano Capozoli/Estúdio Folha
Debatedores em evento que discutiu a economia digital em São Paulo
Debatedores em evento que discutiu a economia digital em São Paulo

Novas tecnologias e novas formas de fazer negócios muitas vezes exigem a adaptação de regras e a criação de outras. Mas é importante que elas não inviabilizem as inovações, e que o excesso de burocracia não dificulte a concorrência para não afetar negativamente o consumidor, afirmam legisladores e estudiosos do tema.

O aluguel por temporada de uma casa ou de parte dela é uma prática que existe há séculos, mas a utilização de plataformas online para isso, que podem facilitar mais de 1 milhão de pernoites em um só dia, é nova.

"Sempre que aparecem inovações, os donos do mercado se posicionam contrariamente a elas e tentam usar a legislação como escudo para barrá-las. É por isso que defendo uma nova regulamentação, que garanta o funcionamento desses novos serviços, sejam ligados à locomoção, sejam ligados ao setor de turismo. Vivemos a maior crise econômica de nossa história, e há esse novo mercado, que movimenta a economia e gera riqueza. Temos é que incentivá-lo", afirma o deputado federal (PSD-GO).

O crescimento das locações por temporada via plataformas online gerou discussões em todo o mundo, e algumas cidades têm encontrado soluções inovadoras (veja texto nesta página).

Para Juliana Pereira, especialista em direito do consumidor e assuntos regulatórios e ex-secretária Nacional do Consumidor, o importante é manter o foco no consumidor, sem tratá-lo de forma infantil a ponto de prejudicá-lo com uma suposta proteção.

"Muita gente acha que sabe o que é o melhor para o consumidor. Mas vivemos num outro contexto. Hoje ele sabe o que quer e pode dizer o que é melhor para ele", afirma.

Segundo Juliana, nem o Código de Defesa do Consumidor, que é de 1990, deve ser utilizado como um óbice à modernização.

André Spinola, gerente nacional de Atendimento Setorial do Sebrae, defende uma regulamentação sem excessos para esse novo momento econômico, que aposta em menos desperdícios, mais produtividade e uso inteligente de tecnologia. "O Estado atrapalha com o excesso de regulamentação. Deve dar pilares e fiscalizar os resultados", afirma.

Emiliano Capozoli/Estúdio Folha

CONCORRÊNCIA

Uma argumentação recorrente para tentar pôr obstáculos à nova economia digital é que ela configuraria concorrência desleal às empresas já estabelecidas. Vinicius Marques de Carvalho, professor de direito comercial da USP e ex-presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), rebate essa crítica.

"Esse novo modelo [de locação via plataformas online] não é anticoncorrencial, é pró-concorrencial e pró-consumidor, uma vez que impõe uma pressão competitiva aos hotéis. Sem competição, o consumidor não tem como avaliar preço e qualidade e fazer comparações", afirma.

Carvalho rebate também a acusação de que o aluguel por temporada representa uma concorrência desleal com os hotéis e explica que pessoas físicas não podem ser tributadas como pessoas jurídicas. "As pessoas acham que, para ter competitividade no mercado, é preciso haver a mesma tributação. Mas não podemos confundir, pois existe concorrência entre empresas que não estão na mesma área de regime jurídico."

Ele cita como exemplo o setor bancário, em que o Banco do Brasil não está sujeito às mesmas regras tributárias de outros bancos e compete com eles. "O aluguel por temporada possui um regime distinto do de hotéis", diz.

Segundo Carvalho, a concorrência desleal acontece quando há propaganda enganosa, quando uma empresa copia elementos de outra ou quando frauda produtos. "Nada disso acontece no modelo do Airbnb", afirma.