Biomarcadores têm papel importante para o diagnóstico do Alzheimer

Detecção mais precisa e na fase inicial da doença pode ser decisiva para o cuidado adequado; evento com foco em neurociência reúne especialistas de várias partes do mundo

Biomarcadores têm papel importante para o diagnóstico do Alzheimer

Biomarcadores têm papel importante para o diagnóstico do Alzheimer Unsplash

Forma mais frequente da demência, entre 60% e 70% dos casos, a doença de Alzheimer figurou como a terceira causa de morte entre as doenças crônicas não transmissíveis nas Américas e na Europa, em 2019 e 2020, de acordo com a Organização Mundial da Saúde.

Se acompanhar a tendência crescente do envelhecimento populacional, até 2050, 139 milhões de pessoas ao redor do mundo vão sofrer de algum tipo de demência.

Esse grande desafio para a saúde pública foi o tema que abriu o Summit Neuroscience Innovation 2021, realizado pela Biogen. A quinta edição do evento reuniu especialistas dos Estados Unidos, Espanha, Reino Unido, Brasil, México, Colômbia e Argentina.

"Somos pioneiros em neurociência, e a inovação faz parte do nosso DNA. Nossa dedicação exclusiva a esse campo nos coloca numa posição única de pensar soluções para os desafios atuais e futuros de saúde pública", afirma Tatiana Branco, diretora médica da Biogen Brasil.

Durante o evento, os especialistas destacaram, entre outras inovações, as novas descobertas da SPIN (Sant Pau Initiative on Neurodegeneration), uma plataforma projetada para a pesquisa de doenças neurodegenerativas a partir de uma abordagem integrativa.

Um dos pilares da iniciativa é identificar os biomarcadores, parâmetros biológicos mensuráveis por meio de testes que podem indicar a presença (e até o estágio) de doenças.

Para avaliar os biomarcadores, os cientistas começaram a iniciativa pesquisando doenças neurodegenerativas, incluindo sujeitos saudáveis, com a doença de Alzheimer, outras demências e até indivíduos com síndrome de Down. A pesquisa teve início em 2009 e já há publicações pelo descobrimento e validação de biomarcadores em fluidos e imagens.

Biomarcadores têm papel importante para o diagnóstico do Alzheimer

PROTEÍNAS

A doença de Alzheimer se caracteriza pelo acúmulo de duas proteínas no cérebro, chamadas beta-amiloide e TAU. Elas geram toxicidade e causam perda de neurônios em áreas do cérebro, como o hipocampo, que controla a memória, e o córtex cerebral, essencial para a linguagem e o raciocínio, memória, reconhecimento de estímulos sensoriais e pensamento abstrato.

Esse acúmulo é gradual e pode ter início 20 anos antes da manifestação da doença. Hoje já é possível buscar a presença de uma dessas proteínas e de outros biomarcadores preditivos para a doença por meio da análise do líquor, o líquido cefalorraquidiano (LCR), que envolve todo o sistema nervoso, incluindo a medula espinhal. O líquido é retirado por meio de uma punção na coluna, na região lombar.

As punções lombares para o exame do LCR têm aumentado a cada ano. Os resultados, segundo os especialistas, mostram que é preciso dedicar mais recursos nessas punções para diagnóstico e que os neurologistas devem se ater também a esse tipo de exame.

Os biomarcadores podem ser cruciais para os pacientes. Por meio desses estudos, foi possível ainda demonstrar o risco elevado da doença para pessoas com síndrome de Down, a partir dos 40 anos, em relação ao resto da população.

Biomarcadores têm papel importante para o diagnóstico do Alzheimer

Um dos principais objetivos do encontro, segundo a diretora médica da Biogen Brasil, é promover o fortalecimento das relações profissionais, de pesquisa e de ensino entre estudantes e pesquisadores da área de neurociências. "Com o evento, conseguimos promover a troca de conhecimento científico em neurociência de ponta, discutir e compartilhar as melhores práticas e tendências de diversos países – e esse intercâmbio de informações médicas entre especialistas (e países) é de extrema relevância."

Tatiana Branco lembrou que, com o envelhecimento da população, a doença de Alzheimer é um desafio ainda maior para a ciência. "Precisamos nos preparar para o futuro e entender o papel da inovação na neurociência. O NS Innovation nasceu diante desse contexto e realidade. O evento permite elevar o diálogo a um nível regional com o objetivo de fomentar a discussão sobre doenças neurológicas em toda a América Latina", afirmou.​

Biomarcadores têm papel importante para o diagnóstico do Alzheimer

Pesquisadoras defendem mais mulheres nas áreas de STEM

As mulheres se destacam cada vez mais nas áreas de STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática), tradicionalmente ocupadas por homens. Obstáculos sociais e escassez de incentivos públicos, no entanto, ainda deixam talentos pelo caminho.

Essa é a análise de quatro referências mundiais em pesquisa que se reuniram no painel "Mulheres em STEM" do NS Innovation.

Mayana Zatz, professora do Instituto de Biologia da USP e coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano, contou que a curiosidade a levou à ciência, mas logo notou que não poderia ficar restrita à pesquisa.

"Ser só cientista não é suficiente no Brasil, você tem que brigar dentro e fora do laboratório", disse Mayana, relembrando o trabalho com células-tronco embrionárias, que só foi liberado após o debate chegar ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal.

Embora a área de STEM seja majoritariamente masculina, a professora disse não sentir preconceito na academia, onde salários são iguais, e mulheres têm direitos respeitados.

As cientistas enfatizaram que, muitas vezes, os maiores obstáculos não estão na universidade e sim na dificuldade de chegar até ela. Também exaltaram o papel feminino no combate à pandemia e nas pesquisas.

Mayana citou pesquisas que revelaram a presença de carga viral 10 vezes maior na saliva de homens e diferenças genéticas em casais em que só um dos cônjuges teve Covid-19.

Para mudar o cenário de STEM, as pesquisadoras acreditam que é necessária uma transformação cultural: que os homens assumam também o papel de cuidador como parte central da família.​

Testes genéticos podem ajudar pacientes com ELA

Avanços na área genômica e novas técnicas de sequenciamento estão ampliando o conhecimento sobre a esclerose lateral amiotrófica (ELA), afirma Marcondes França, professor Livre-Docente do departamento de Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas, da Unicamp, um dos palestrantes do NS Innovation.

A esclerose lateral amiotrófica é uma doença degenerativa rara, que afeta o sistema nervoso de forma progressiva. Os pacientes sofrem paralisia gradual e, em 75% dos casos, morrem precocemente, resultado da perda de capacidades cruciais, como falar, movimentar, engolir e até mesmo respirar.

Do ponto de vista genético, a doença se divide em dois subgrupos: a ELA familiar e a ELA esporádica, que corresponde a grande maioria, 9 em cada 10 pacientes. "São pacientes com alterações genéticas que, isoladamente, não são capazes de causar a doença, mas combinadas a fatores ambientais podem desencadear o seu aparecimento."

O principal fator de risco nesses casos é uma variante que se localiza no gene Ataxina 2, conhecido na neurologia por estar relacionado também a outra doença degenerativa, a ataxia espinocerebelar do tipo 2 (SCA2). "Um estudo publicado na revista 'Nature', em 2010, mostrou que pacientes com modificação nesse gene têm aumento de risco relativo, de 2 a 2,5 vezes maior que a população em geral."

Nos casos de esclerose lateral amiotrófica familiar, há um impacto menor de fatores ambientais. "Há um padrão monogênico, de variantes genéticas raras, capazes de levar ao aparecimento da doença."

PREVENÇÃO

Segundo ele, existe uma relevância clínica que justifica investigar por meio de testes genéticos a ELA familiar. "Poder oferecer aconselhamento ao paciente ou à família, discutir riscos de recorrência e, se em idade fértil, orientar como agir preventivamente."

Há ainda impacto em como a doença vai se desenvolver em cada paciente, por conta do gene que a desencadeou. "Entendendo a base genética, consigo oferecer um dado importante ao paciente quanto ao seu prognóstico", afirmou.