Indústria química avança para viabilizar transição sustentável

Setor, reconhecido pelo esforço em reduzir a emissão de gás carbônico no processo produtivo, pode ampliar atuação com políticas públicas e estímulos

A indústria química brasileira trabalha constantemente para que a transição química verde mantenha o país como referência global em termos de sustentabilidade. A matriz elétrica do país é 88% renovável, índice bem acima da média dos outros países, de 29%, segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do Ministério de Minas e Energia.

Ainda em janeiro de 2020, a prestigiosa revista "Science" já citava a importância do debate para discutir as bases da chamada química do futuro, pois, em razão das mudanças climáticas, a sustentabilidade deve ser a base de tudo.

Há mais de uma década, no entanto, o termo "química verde" vem sendo usado para apresentar processos industriais que partem de matérias-primas mais sustentáveis. Mas, hoje, já se sabe que é preciso ir mais além.

Nas cadeias de produção, deve ocorrer também uma maior preocupação com o consumo de energia, de água, a reutilização dos resíduos, com a adoção da chamada economia circular, e com o uso cada vez mais intenso de matéria-prima renovável.

Na prática, apenas para ficar em dois exemplos, é gerar álcool também via o próprio caldo da cana e produzir plástico com o máximo de eficiência e o mínimo de desperdício.

Nessa cadeia produtiva, o setor químico brasileiro é exemplo a ser seguido, pois são processos que as empresas químicas brasileiras conhecem bem, segundo a engenheira química Daniela Manique, presidente do Conselho Diretor da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química).

"Há um crescente uso de matérias-primas e alternativas de origem renovável para o desenvolvimento de produtos em praticamente todos os segmentos de mercado que alcançam os consumidores finais", afirma Manique.

O avanço do setor ocorre muito por causa do conjunto de facilidades que o Brasil tem, como uma grande biodiversidade e as várias fontes de energia renovável à disposição.

A capilaridade da indústria química no Brasil, segundo dados do estudo "Missões para a Indústria Química no Brasil – Environmental, Social and Governance (ESG) Made in Brazil", publicado em 2023 pela Abiquim, é enorme.

É o terceiro maior setor industrial do Brasil, mas, assim como ocorre nas economias desenvolvidas, o segundo com maior índice de inter-relação na matriz industrial nacional, ficando atrás apenas da área de petróleo e gás natural.

Por estar na base da matriz de todos os segmentos de uma economia moderna, o setor é fundamental para o desenvolvimento de uma economia sustentável, muitas vezes, inclusive, com a produção de itens que passam invisíveis pela população.

Os números corroboram a importância do setor químico para o processo de reindustrialização do país. A demanda por produtos químicos no Brasil registrou crescimento médio anual de 3,1%, de 1990 a 2021, índice acima dos 2,2% de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) no período.

O setor, porém, teve retração de 10,1% na produção em 2023 justamente pelo avanço de insumos importados de países que, diferentemente do Brasil, vão no sentido contrário da transição sustentável.

POLÍTICAS PÚBLICAS

"A indústria química tem feito sua parte, mas é necessário que sejam estabelecidas políticas públicas que facilitem o crescimento do setor", avalia a dirigente da Abiquim.

De acordo com Manique, é preciso, por exemplo, melhorar a oferta de gás natural com custos competitivos, ampliar a matriz energética limpa, viabilizando a produção de hidrogênio verde, e criar soluções que alavanquem cadeias sustentáveis de químicos e favoreçam a produção eletrointensiva de outros químicos (tais como metanol, hidrogênio verde, amônia verde e biogás/biometano).

"Além disso, é importante o desenvolvimento de bioprodutos, que oferecem muitas oportunidades em alcoolquímica [etanol, açúcar e álcool] e oleoquímica [óleos vegetais]", afirma Manique, que também é presidente do Grupo Solvay.

A especialista afirma ainda que, sem uma estruturação mais firme de políticas públicas para o setor, há risco de o Brasil perder uma janela de oportunidades importantes voltada para a consolidação da química do futuro. "Vários países estão colocando o tema como prioridade de seus programas de desenvolvimento", explica.

No caso norte-americano, a partir de dois programas de estado (infraestrutura e redução da inflação), mais de US$ 2 trilhões foram injetados em vários eixos voltados para o aumento da competitividade industrial. A China segue a mesma linha.

Para incentivar o crescimento e aumentar o número de produtos que contribuem para o combate às mudanças climáticas, o setor afirma que é preciso ainda estimular políticas públicas por meio de metas de conteúdo de base biológica (por exemplo, em embalagens), além de agilizar a revisão das regras do programa RenovaBio, do Ministério das Minas e Energia, cujo objetivo é expandir a produção de biocombustíveis, fundamentada na previsibilidade e sustentabilidade ambiental, econômica e social.

DIÁLOGO COM O SETOR

Rodrigo Rollemberg, secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, diz que a pasta está empenhada em promover o diálogo com os setores produtivos para desenvolver e aperfeiçoar políticas públicas voltadas para a transição energética, a descarbonização da economia e o desenvolvimento da bioeconomia.

"São princípios alinhados com os objetivos da missão 5 da Nova Indústria Brasil e reforçam o compromisso do país em liderar a transição para uma economia mais sustentável e baseada em recursos renováveis", afirma Rollemberg.

De acordo com o secretário, existe um empenho para que o Brasil cumpra seu papel de liderar a transição global para uma economia baseada em hidrogênio verde, biogás, biometano, biocombustíveis e economia circular.

"A diversidade de recursos naturais e a expertise do país em agricultura, energia e tecnologia o colocam em uma posição única para explorar essas oportunidades de forma sustentável", afirma Rollemberg.

Um dos aspectos que merece atenção, segundo o gestor do MDIC, é o potencial da bioeconomia na geração de bioprodutos e biocompostos como substitutos sustentáveis para os produtos químicos tradicionais.

Pela lógica do governo, a utilização de biomassa e recursos renováveis na produção de matérias-primas químicas não apenas reduz a dependência de fontes fósseis mas também é importante para reduzir as emissões de carbono e desenvolver uma economia circular mais eficiente.

"O ministério está empenhado em estudar mecanismos para que o expressivo parque industrial do Brasil, atualmente operando abaixo de sua capacidade total, possa realizar uma transição rápida e eficaz para a produção de químicos verdes", diz Rollemberg.

De fato, números da Abiquim mostram que, enquanto a produção interna subiu apenas 1,4% ao ano entre 1990 e 2021, as importações cresceram 9,5% ao ano no mesmo intervalo temporal.

Com oportunidades internas sendo perdidas, as importações passaram a ocupar quase 50% de toda a demanda do mercado interno no setor químico em 2021, contra 7% no início dos anos 1990.

*Conteúdo patrocinado produzido pelo Estúdio Folha