Concorrência desleal e preço de insumos básicos são entraves

Base para inúmeros produtos manufaturados, a indústria química, se estimulada, terá capacidade de gerar mais empregos qualificados, além de ampliar o desenvolvimento e a inovação tecnológica do país

A indústria química é estratégica para a economia da maioria dos países. O setor químico produz insumos para 96% de todos os bens manufaturados. Isso inclui alimentos, bebidas, combustíveis, plásticos, autopeças, defensivos agrícolas, fertilizantes, cosméticos, eletroeletrônicos, tintas. Por isso, tem efeito multiplicador na geração de empregos e no crescimento econômico.

Mas a indústria química brasileira enfrenta desafios de competitividade que têm gerado efeitos negativos em seu desenvolvimento. Entre eles estão o avanço da concorrência externa e o alto custo das matérias-primas.

"O Brasil não consegue concorrer em condições iguais com a indústria asiática, por exemplo, que opera com subsídios altos do governo. É uma luta ingrata, de um peso pena contra o Mike Tyson", afirmou Paulo Gala, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV) e especialista em desenvolvimento industrial, no painel "Insumo Base para os Diversos Mercados e Aplicações", do seminário "A importância da Indústria Química para a Sociedade e a Transição para a Química Verde."

"É difícil para o Brasil concorrer com a indústria química asiática, que opera com altos subsídios do governo. É uma luta ingrata, de um peso pena contra o Mike Tyson" - Paulo Gala, economista da Fundação Getulio Vargas

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PAULO GALA, ECONOMISTA DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS - Alessandro Dias/Estúdio Folha

O painel apontou caminhos para aumentar a competitividade e a produção do setor químico que, se estimulado, terá capacidade para gerar empregos qualificados, desenvolvimento e inovação.

Para Leonardo Durans, diretor do departamento de desenvolvimento da indústria de insumos e materiais intermediários do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), a retomada do Regime Especial da Indústria Química (Reiq) é um exemplo de mecanismo para estimular a indústria. Criado em 2013, o Reiq prevê a isenção de PIS/Cofins na compra de insumos utilizados pelas empresas do setor.

Além da redução da carga tributária, o Reiq prevê créditos adicionais para investimentos. "Temos hoje uma nova modalidade, o Reiq Investimento, que permite às empresas ampliarem a capacidade instalada de produção de químicos e petroquímicos, aumentar a competitividade e inovar no processo produtivo", afirmou Durans.

Salário e sustentabilidade

Segundo o economista Paulo Gala, o grande desafio do Brasil hoje é desenvolver setores com potencial para pagar salários maiores e gerar inovação. "A indústria química é um exemplo disso, porque gera arrecadação de impostos, altos salários com emprego formalizado e inovação tecnológica."

"O governo está olhando para a indústria de forma sistêmica, para os insumos, como o gás natural, tentando identificar as oportunidades" – Leonardo Durans, diretor do departamento de desenvolvimento da indústria de insumos e materiais intermediários do MDIC

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LEONARDO DURANS, DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA DE INSUMOS E MATERIAIS INTERMEDIÁRIOS DO MDIC - Alessandro Dias/Estúdio Folha

Mas, para o economista, a indústria química brasileira está em uma encruzilhada, pois tem o potencial de liderar o futuro do Brasil em salários e sustentabilidade, mas sofre um golpe histórico na produção.

Hoje, o setor químico opera com 64% da capacidade instalada, a pior em 20 anos. "A indústria química precisa da força das instituições públicas, de financiamento e, eventualmente, de alguma proteção contra práticas ambientais não corretas dos concorrentes internacionais", disse Gala.

Participação do Estado

Rafael Lucchesi, diretor de desenvolvimento industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), descreveu três cenários atuais que podem criar janelas de oportunidade para a indústria brasileira: a ascensão de uma nova dinâmica produtiva, com a economia digital; os extremos climáticos; e a crescente complexidade geopolítica.

"Nesses três aspectos, o Brasil tem vantagens estratégicas, porque pode incorporar os novos fatores produtivos da economia digital, impulsionados pela descarbonização e pela transição energética. O Brasil pode ser a Arábia Saudita na produção de energia verde, barata, segura e em grande quantidade", afirmou. "Temos também a enorme vantagem de uma geopolítica bem balanceada e articulada com todos os principais blocos."

"O Brasil pode ser a Arábia Saudita da produção de energia verde, barata, segura e em grande quantidade" – Rafael Lucchesi, diretor de desenvolvimento industrial da CNI

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RAFAEL LUCCHESI, DIRETOR DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL DA CNI - Alessandro Dias/Estúdio Folha

Mas, segundo Lucchesi, no mundo inteiro os países criam incentivos para alcançar esses resultados. "O setor industrial é o mais sofisticado e responsável, no Brasil, por 70% dos investimentos em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) e pelos melhores salários", disse Lucchesi. "Sem atenção à indústria, vamos todos empobrecer."

"Nunca existiu desenvolvimento industrial sem a presença do Estado", afirmou Leonardo Durans, citando que o governo federal recriou, depois de oito anos inativo, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial, para estruturar uma nova política industrial para o país.

Uma das ações é a discussão sobre o aumento da oferta de gás natural e a redução do preço desse insumo, que é importante para a indústria química. "O governo está olhando para a indústria de forma sistêmica, para os insumos, como o gás natural, e tentando identificar as oportunidades", afirmou Durans.

"Todos temos a mesma preocupação, que é, a partir dos acordos possíveis, fazer as definições de boas políticas públicas para o setor" – deputado Afonso Motta, presidente da Frente Parlamentar da Química

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DEPUTADO AFONSO MOTTA, PRESIDENTE DA FRENTE PARLAMENTAR DA QUÍMICA - Alessandro Dias/Estúdio Folha

Para o deputado federal Afonso Motta, presidente da Frente Parlamentar da Química, o setor vive hoje uma situação desigual, especialmente pela competição internacional e o alto valor dos insumos.

"Não é fácil estabelecer uma agenda. Para conseguir colocar na pauta uma regulação que possa, por exemplo, ter uma repercussão direta e imediata na competição com os produtos importados, precisamos antes montar uma estratégia, porque hoje a lógica parlamentar é colocar na pauta temas que tenham consenso, entendimento e uma grande maioria", afirmou Motta.

"Temos todos a mesma preocupação, que é, a partir dos acordos possíveis, fazer as definições de boas políticas públicas para o setor químico", completou o parlamentar.

*Conteúdo patrocinado produzido pelo Estúdio Folha