Base Nacional Comum Curricular prevê integração entre conteúdo, formação docente, material didático e avaliações

Quando um aluno deve saber calcular porcentagem ou a partir de que momento a criança deve ser capaz de escrever uma carta simples? É para indicar com precisão as competências que todos estudantes têm o direito de desenvolver a cada ano de escolaridade - da educação infantil ao ensino médio - que foi criada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

Das nações que hoje são referências de qualidade na educação, todas passaram por revisões curriculares e o documento brasileiro é fruto de um processo que começou em 2014 e teve a participação de governos, professores e especialistas. "A Base representa um avanço consistente, de política de Estado e que deve ser assegurado", afirma Ghisleine Trigo Silveira, coordenadora da versão 3 da BNCC.

A educadora explica que a BNCC é uma referência nacional obrigatória, mas não se pode confundi-la com o currículo. "O papel da Base será justamente o de orientar a revisão e a elaboração dos currículos nos Estados e nos municípios. Os sistemas podem interagir para que temáticas sejam ampliadas ou especificadas para atender questões regionais, desde que as competências sejam desenvolvidas."

Em miúdos, a BNCC dá o rumo e indica aonde se quer chegar. Mas são os currículos que vão definir os caminhos. Independentemente da estratégia curricular, o importante é garantir que um estudante matriculado no segundo ano do fundamental em uma escola pública do interior do Acre, por exemplo, tenha o direito de desenvolver as mesmas competências e habilidades que uma criança da mesma série que frequenta um colégio particular em Curitiba.

Adriana Komura/Estúdio Folha

Protagonismo do aluno

Para que a BNCC consiga ser traduzida em melhoria do aprendizado e mais equidade, no entanto, é preciso envolver todo o sistema: preparar os docentes na formação inicial e na formação continuada a partir desse novo parâmetro, garantir que os materiais didáticos - de livros a aulas digitais estejam alinhados e, por fim, ajustar as avaliações nacionais para que fiquem coerentes com as novas diretrizes.

"São ações que têm de acontecer de forma concomitante. Será um esforço, mas já está mais que na hora de fazermos isso em prol dos alunos", afirma Claudia Costin, professora visitante de Harvard e ex-diretora de Educação do Banco Mundial. "O livro didático precisa dialogar com o currículo, professores têm de saber aplicar o conteúdo e as escolas precisam ter infraestrutura para garantir que o processo aconteça."

Tudo isso sem perder de vista o protagonismo do aluno e sua formação crítica para cidadania, um princípio manifesto linha a linha nas competências descritas para cada uma das disciplinas, mesmo naquelas em que isso parece mais improvável.

"Até recentemente, em matemática, o foco no ensino médio era ensinar fórmulas para quem vai fazer vestibular", afirma João Bosco Pitombeira, um dos redatores de matemática da BNCC. "A Base tirou o foco disso e considera, por exemplo, que saber ler e interpretar uma informação estatística e chegar a conclusões sobre ela é vital para a construção da cidadania."

Em história, o desafio é instigar um raciocínio que não seja dual: "Entre a bruxa e a princesa há uma série de variáveis e o professor tem de trabalhar com todas elas", exemplifica Janice Theodoro da Silva, do departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. "O objetivo é desenvolver a inteligência desse sujeito. É um longo caminho. Mas a educação é um longo caminho."

Bruno Nogueira/Estúdio Folha