Recuo do setor se agrava, e país piora nos índices globais

Há décadas, indústria brasileira sofre com falta de incentivos e excesso de impostos; baixo investimento deprimiu setor ao longo do tempo

Recuo do setor se agrava, e país piora nos índices globais

Recuo do setor se agrava, e país piora nos índices globais CNI/Divulgação

O Brasil tem perdido espaço no setor industrial. Na década de 80, a indústria brasileira chegou a responder por quase metade do PIB do país. Desde a década de 90, o processo de desindustrialização vem se agravando.

Hoje, o setor como um todo, representado por transformação, construção civil, extrativa e de utilidade pública, como energia elétrica e água, responde por 22,2% do PIB. E a indústria da transformação, que gera mais valor agregado e melhores empregos e salários, pois exportar um avião gera mais riquezas do que minério de ferro, é um dos maiores exemplos do recuo. Em 1985, representava 36% do PIB. Esse número foi minguando, atingindo em 2021 apenas 11%.

Renato Fonseca, superintendente de Desenvolvimento Industrial da CNI (Confederação Nacional da Indústria), afirma que a retração na indústria de transformação se deve a vários fatores, como falta de incentivos, excesso de tributos, pouco investimento, baixa competitividade e problemas de logística, que compõem o chamado Custo Brasil (leia texto abaixo).

Esses fatores causaram retração na indústria de transformação ao longo dos anos, levando à commoditização das nossas exportações e a uma maior concentração das exportações industriais em produtos básicos, de bens de consumo não duráveis.

"A queda na indústria de transformação, que já foi a 8ª do mundo, ocorreu basicamente em importação e não em produção local. Isso gerou um déficit crescente na indústria brasileira, sobretudo nos setores mais intensivos em tecnologia, bens de capital e bens de consumo duráveis. Ou seja, setores com maior capacidade de alavancar o crescimento da economia."

A participação da indústria nacional na produção global também caiu. Em 1995, a indústria manufatureira representava 2,77%. Em 2021, esse índice caiu para 1,28%. No total das exportações brasileiras, a indústria também perdeu espaço. A de transformação, por exemplo, recuou de 80,9% em 1997 para 51,3% em 2021. Isso provocou recuo do Brasil nas exportações mundiais nesse setor, caindo de 0,91% em 1996 para 0,81% em 2021."O país não cresce, esse é o ponto. E a agricultura não emprega o suficiente para reduzir o desemprego. O setor de serviços começa a empregar mais, mas ainda não gera empregos de qualidade nem foca inovação", afirma.

Fonseca explica que a indústria tem o poder de puxar muito mais o crescimento de outros setores porque possui cadeias produtivas longas por ser o grande indutor de inovações da economia. Um efeito dominó, lembra ele, muito mais potente. "É preciso que a indústria tenha uma política pública assertiva, com os incentivos e financiamentos que o setor agropecuário recebeu ao longo dos últimos anos."

A desindustrialização brasileira é ainda mais grave quando observado o contexto global, de acordo com o Plano de Retomada da Indústria, elaborado pela CNI. A pandemia de Covid-19 e o conflito Rússia-Ucrânia revelaram fragilidades das cadeias de suprimento.

Todo esse cenário adverso motivou decisões estratégicas sobre relocalização produtiva, uma oportunidade que o Brasil deve aproveitar, registra a CNI.

Ainda de acordo com o documento, "as novas políticas industriais contemplam não apenas a criação de oferta como também medidas para assegurar a demanda para os seus produtos em escala global. Incentivam a produção em alta escala, a inovação e o desenvolvimento tecnológico, além da captura de mercados para as suas empresas".

Custo Brasil emperra crescimento

Expressão cunhada nos anos 90, o Custo Brasil refere-se a uma série de dificuldades tributárias, logísticas, burocráticas e de relações trabalhistas anacrônicas, entre outros fatores, que emperram o crescimento do Brasil. Na prática, corroem o ambiente de negócios e tornam a corrida da competitividade de produtos brasileiros no exterior desigual, por vezes inviável.

Um estudo recente do Ministério da Economia, coordenado pelo MBC com o apoio de associações de indústria, reúne 12 elementos que praticamente anulam a competição do Brasil com países que compõem a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e contam com uma legislação moderna.

Entre esses itens estão o alto custo para se abrir um negócio, o elevado custo do crédito, limitações da infraestrutura de mobilidade urbana e alta complexidade tributária. Esses problemas, somados a outros, fazem com que o Custo Brasil seja estimado em R$ 1,5 trilhão ao país.

"Em setores como o aço, o Custo Brasil representa cerca de 16% do produto final para exportação. Outros setores também sofrem com excesso de tributos, relações trabalhistas desfavoráveis ao investimento, logística, energia elétrica cara, só para citar alguns itens", diz Jorge Gerdau, presidente do conselho superior do MBC (Movimento Brasil Competitivo), entidade que reúne os setores público e privado para aumentar a competitividade no país.

Há um consenso entre empresários e na sociedade brasileira que o principal ingrediente do Custo Brasil é a carga tributária, considerada elevada, complexa e anacrônica. Rogério Caiuby, conselheiro executivo do MBC, explica que as empresas brasileiras gastam em média 1.300 horas por ano para honrar seus tributos. "É algo em torno de um exército de 20 a 30 pessoas trabalhando, enquanto nos países da OCDE essa cifra não chega a 160 horas."

No Plano de Retomada da Indústria, a reforma tributária é crucial, com a adoção do IVA (Imposto sobre Valor Agregado). Ele eliminaria o IPI, o PIS, a Cofins, o ICMS e o ISS. "O prejuízo que causamos por não ter feito a reforma tributária é catastrófico, perdemos muita competitividade ao longo dos anos. Tudo isso nos limita enormemente e precisamos corrigir", avalia Gerdau.