Mais de R$ 30 bilhões, ou cerca de 13% da receita total das operadoras de saúde no Brasil, foram perdidos no ano passado em decorrência de fraudes e desperdÃcios, de acordo com estimativa de um estudo recém publicado, feito pela consultoria EY para o Instituto de Estudos da Saúde Suplementar, o IESS.
"Todos perdem com a fraude, o setor perde como um todo: operadoras, prestadores, governo, sociedade e, especialmente, o consumidor ou beneficiário. Especialmente porque na maioria das vezes observamos que o consumidor é a maior vÃtima, é utilizado como instrumento, como um inocente útil", afirma Luiz Celso Dias Lopes, presidente do IESS.
Lopes participou da mesa "Combate a fraudes e desperdÃcios na saúde suplementar", que reuniu também Jorge Oliveira, presidente do Grupo Promédica, e Nuno Vieira, sócio de serviços financeiros da EY.
Os prejuÃzos para o setor fizeram com que a Abramge lançasse dois vÃdeos dentro do movimento "Todos Por Todos Com Muita Saúde" para conscientizar os beneficiários sobre os riscos de serem usados para a prática desse tipo de crime. "Um golpe que acaba deixando o plano de saúde mais caro pra todo mundo", destaca o vÃdeo, que foi apresentado durante o seminário da entidade.
O foco da campanha é alertar que essas práticas fraudulentas podem configurar crime – dividir o valor da consulta em dois recibos, por exemplo, se enquadraria em falsidade ideológica, diz Lopes. "É importante que a gente possa dizer isso para a sociedade, explicar para o consumidor de maneira didática a gravidade das fraudes."
Para Jorge Oliveira, da Promédica, a conscientização é um dos principais caminhos para lidar com a questão. "É fundamental e tem que percorrer toda a cadeia da saúde suplementar, passando pelo beneficiário, órgão regulador e até o Judiciário. Muitas vezes, na visão do beneficiário em relação às operadoras, ele se vê em uma luta desigual, em uma condição hipossuficiente. Então, na verdade, ele encara a fraude como um 'mecanismo de defesa'."
É importante que a gente possa dizer isso para a sociedade, explicar para o consumidor de maneira didática a gravidade das fraudes
A agência reguladora, na opinião de Oliveira, tem que assumir protagonismo na conscientização dos usuários, mas deve haver disposição e clareza de todos. Para ele, seria importante também uma campanha que esclarecesse sobre as "obrigações". "No Brasil, costumamos falar mais sobre direitos. Temos que mudar isso na saúde suplementar".
Tecnologia a favor
O presidente do IESS diz que é difÃcil precisar se as fraudes cresceram nos últimos anos. "Na verdade, o que estamos vendo é o aprimoramento dos controles, da governança, dos processos e do uso da tecnologia para prevenir a fraude e detectá-la mais rapidamente, uma vez que a gente não consegue prevenir 100%, pelo menos detectamos mais rápido."
Lopes, porém, também pondera que é preciso discutir a legislação para tornar o sistema mais seguro. Ele lembra que atualmente, por decisão judicial, as operadoras não podem exigir indicação da CID, Classificação Internacional de Doenças, para pedidos de exames. A CID é composta de códigos usados para registrar as condições de saúde do paciente em hospitais e consultórios, que podem ser usados com finalidade estatÃstica, para a análise de dados de saúde, o monitoramento de doenças, a elaboração de relatórios epidemiológicos e a formulação de polÃticas de saúde. E também servem para coibir fraudes.
"A tecnologia sem o dado, sem a informação, não vale para nada. Temos no setor uma grande assimetria de informação, algo que temos que enfrentar: a informação da CID. Precisamos dessa informação para o bem, para que a tecnologia possa funcionar. Precisamos superar essa barreira e ter o dado assistencial. Sem a CID, não avançamos. Tecnologia sem dados, sem informação, não serve para o que de fato ela poderia servir", afirma.
Estamos em uma posição reativa, o fraudador vai descobrindo formas de fraudar e só com a tecnologia não conseguimos combater, precisamos de pessoas
O presidente da Promédica lembra que, além de tecnologia, é preciso investir também em pessoal. "Tem muita coisa que depende de pessoas para estabelecer o controle. Estamos em uma posição reativa, o fraudador vai descobrindo formas de fraudar e só com a tecnologia não conseguimos combater, precisamos de pessoas, depende de gente para estabelecer o controle", alerta.
Nuno Vieira, da consultoria EY, responsável pelo Estudo de Fraudes e DesperdÃcios em Saúde Suplementar, afirma ser impossÃvel eliminar as fraudes, apenas reduzi-las e mitigar o problema. Para ele, além de rediscutir a legislação, é preciso criar mecanismos de combate à fraude.
"A questão é que, a cada R$ 100 que as operadoras recebem, cerca de R$ 12 serão pagos em fraude. O problema é sistêmico e vai necessitar das operadoras, da ANS e dos poderes públicos pensarem eventualmente em determinadas formas de legislação ou combate através da polÃcia. A boa notÃcia é que nós sabemos o que é preciso fazer para mitigar esse risco. Mas nós vamos precisar nos unir", diz Vieira.
A boa notÃcia é que nós sabemos o que é preciso fazer para mitigar esse risco. Mas nós vamos precisar nos unir
Segundo o levantamento da EY, quem busca fraudar o sistema precisa ter mais do que a oportunidade e a disposição ao risco. "Os fraudadores dependem do sistema e da forma como o sistema está construÃdo, e talvez seja nessa parte do sistema que temos que mexer", afirma o consultor.
Para Oliveira, fraude e desperdÃcio podem ser duas faces da mesma moeda – ele cita, por exemplo, o caso de um médico que pede, de forma desnecessária, a repetição de um exame. "É um desperdÃcio e também, uma fraude ética. É um desvio ético fazer algo dessa natureza. Há uma intercessão grande entre fraude e desperdÃcio."
*Conteúdo patrocinado produzido pelo Estúdio Folha