Aconteceu o 2º dia do 3º Seminário Internacional de Educação Integral (Siei)l. O evento é uma parceria da Fundação Itaú Social com a Fundação SM. Em andamento no Sesc Pompeia, o SIEI tem como tema o "Desenvolvimento Integral e a Aprendizagem: o mesmo direito, várias realidades".Veja como foi o 1º dia do Siei.
Confira o que foi debatido no 2º dia do evento:
16h00 - Roda de conversa - "Educação de Alma Brasileira": Educação Integral e a construção da democracia
Tendo como gancho o livro "Educação de Alma Brasileira", apoiado pela FSM, Fundação Itau Social e Instituto C&A, que debate a história da Educação Brasileira a luz das ideias de seus grandes educadores e das ameaças às suas ideias ao longo dos tempos, esta mesa tem como objetivo encerrar o seminário com um debate inspirador sobre uma educação para o Brasil que queremos.
Helena Singer - Ashoka
Ligia Stocche - Mapa Educação
Jessica Moreira - Coletivo Nós, mulheres da periferia
Marcelo Palmares - Pombas Urbanas
Mediação: Natacha Costa
Próximos passos da educação integral brasileira
Que educação queremos para o Brasil? A 3ª edição do SIEI foi encerrada com uma roda de conversa em torno dessa questão. As respostas foram buscadas tendo como ponto de partida o livro "Educação de Alma Brasileira", de Antônio Lovato, distribuído a todos os participantes do seminário.
Helena Singer, da organização Ashoka, iniciou a discussão destacando que este é o momento de repensar a história da educação nacional.
"Esse modelo [de educação] que temos não é brasileiro, foi formulado no hemisfério norte. Só vamos dar nossa contribuição ao mundo se compartilharmos nossa diversidade, nossa cultura, e não ficarmos correndo atrás de um projeto que não é nosso", afirmou. "A ideia não é apenas relatar boas experiências, mas também os conflitos da nossa própria alma. O Brasil é violento e desigual, e não se pode esconder esse fato se quisermos falar das nossas potências."
A educadora destacou alguns pontos do livro de Antônio Lovato. A obra examina a história da educação no país, bem como formas de transmissão de conhecimento realizadas com base em eixos como o uso e a transformação do conhecimento vindo de fora, a importância de Paulo Freire, a experiência da amorosidade na condução da educação, o empreendedorismo e o resgate de histórias de educadoras mulheres.
De sua experiência no Mapa da Educação, Ligia Stocche destacou que os relatos mais marcantes são aqueles que mostram que os estudantes querem ser ouvidos e que os projetos que oferecem experiências conectadas a suas realidades geram melhores frutos. Para ela, não é mais possível deixar de ouvir os estudantes na discussão dos planos de educação.
"Temos que usar a potência desses estudantes para pensar a escola que queremos", disse.
Jessica Moreira, do coletivo Nós, mulheres da periferia, falou sobre a importância de ver a educação a partir dos territórios. Seu grupo, formado por seis jornalistas, leva comunicação a mulheres periféricas em São Paulo.
"Na periferia, na falta de acesso, na omissão do Estado, a gente vê a força da inventividade e cria muitas alternativas, principalmente educacionais", disse.
A importância da conexão entre educação e cultura foi destacada por Marcelo Palmares, do Pombas Urbanas, projeto da Cidade Tiradentes, em São Paulo.
"Querem nos colocar em caixinhas. Mas nossa diversidade não cabe nas caixinhas. Somos muitos diversos. Neste corpo negro também tem sangue indígena e europeu. Essa fusão não cabe mais dentro das salas de aula. Tem que caber dentro de um espaço cultural", afirmou.
A mediadora Natacha Costa questionou os convidados sobre os avanços já realizados e indagou quais são os elementos de que não é possível abrir mão para construir uma educação com alma brasileira.
"A ideia de que toda criança tem o direito de estar na escola é uma conquista", disse Helena Singer. Ao mesmo tempo, lembrou que já está reconhecido o conceito de que a educação não se resume à escola, o que ajuda a garantir a manutenção de experiências como o Pombas Urbanas.
Antônio Lovato, autor do livro, afirmou que uma das principais conquistas é o direito de brincar, e que não é mais possível abrir mão da Lei de Diretrizes e Bases.
"Não podemos abrir mão do direito da escola de pensar sua autonomia, sua pedagogia, seu olhar, de poder dialogar. Isso está em risco principalmente num momento de retrocessos. Precisamos ter os olhos bem abertos e os corpos bem ativos para não perder isso", afirmou.
11h00 - Roda de conversa: O papel das políticas públicas na garantia do direito à Educação Integral
É fundamental que crianças, adolescentes e jovens tenham garantido seu pleno desenvolvimento. Essa mesa debaterá a importância do cumprimento das metas do PNE como condição estrutural para a educação integral, refletindo sobre questões como aprendizagens e participação social em territórios diversos e nas diferentes realidades educacionais.
Anna Helena Altenfelder - Presidente do Conselho de Administração
Chico Soares - Conselho Nacional de Educação
Macaé Evaristo dos Santos - Secretaria Estadual de Minas Gerais
Maria Rehder - Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Mediação: Angela Dannemann - Superintendente do Itaú Social
O papel das políticas públicas na garantia do direito à Educação Integral
A importância do cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) foi o tema da mesa "O papel das políticas públicas na garantia do direito à Educação Integral". A mesa se reuniu na manhã do segundo dia do 3º Seminário Internacional de Educação Integral.
Dando início ao debate, a secretária Estadual de Educação de Minas Gerais, Macaé Evaristo dos Santos, alertou sobre a importância da luta pela plena realização do PNE, principalmente da meta número 20 - que trata da ampliação do investimento público em educação pública de modo a atingir, no mínimo, o patamar de 10% do PIB.
"A meta 20 é a garantia do direito à boa escola, com boa infraestrutura, professores bem formados e permanência da equipe pedagógica em um projeto educativo continuado. Isso não é querer privilégio, é direito", disse Macaé.
Direito que, de acordo com a Campanha Nacional de Educação, depende da revisão do modo como é feito o financiamento da educação pública. Hoje, a União responde por 18% dos recursos, enquanto Estados e municípios arcam com 40% e 42%, respectivamente. O movimento defende a inversão dessa proporção, aumentando a responsabilidade da União.
"Hoje, de cada R$ 1 investido por Estados e municípios, a União participa com R$ 0,10. A campanha reivindica que a União participe com R$ 0,50 de cada real", explicou Maria Rehder, coordenadora de projetos da Campanha Nacional pelo direito à educação.
Garantir a existência de recursos é condição imprescindível num país com um sistema educacional historicamente desigual, sublinhou Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração. "As populações carentes são historicamente excluídas das escolas." Na sequência, alertou para o fato de que questões como gratuidade e escola laica sofrem avanços e retrocessos de acordo com o momento político. "Toda situação de ditadura e endurecimento político vem acompanhada de reforma educacional e da retirada de direitos."
Por fim, Chico Soares, do Conselho Nacional de Educação, defendeu o "monitoramento do direito à educação" e o papel da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) nesse contexto. "Estamos fazendo uma proposta da BNCC, sei que imperfeita, mas estamos explicitando direitos. A exclusão gerada pelo não aprendizado é tão séria quanto a de um grupo aprender menos que outro."
9h40 - Palestra: "A importância de educar na atenção"
Catherine L'Ecuyer
A crise da educação é uma crise de atenção. Sem atenção, não há aprendizado. O que contribui para reduzir a atenção? Qual é o mecanismo da atenção? Qual a diferença entre fascínio passivo e atenção sustentada? Quais são os efeitos do uso da tecnologia em idades precoces? Como podemos melhorar a atenção de nossos filhos e estudantes? Quais são os mitos sobre o cérebro no campo educacional? Quais são os efeitos da multitarefa tecnológica? Qual é a importância das relações interpessoais na consolidação da atenção?
Mediação: Pilar Lacerda - diretora da Fundação SM
Atenção é premissa fundamental para o processo educativo
"A crise educativa é, principalmente, uma crise de atenção". A partir desse juízo, a educadora canadense Catherine L'Ecuyer, autora do livro "Educar na Curiosidade", falou sobre os fatores que reduzem a capacidade das crianças de ficar atentas e elencou atitudes de pais e educadores que podem ajudar a recuperar e preservar essa habilidade inata.
Diego Padgurschi/Estúdio Folha | ||
Catherine L'Ecuyer abriu o 2º dia do Seminário Internacional de Educação Integral. Segundo a educadora, "a crise da educação é uma crise de atenção" |
Veja os principais pontos:
Atenção não é o mesmo que fascínio
Atenção é a atitude da pessoa que está na expectativa do que vai acontecer; é uma atitude ativa, sem filtro nem preconceito. Fascínio é a atitude passiva de quem espera estímulos externos. A atenção nasce do contato com a realidade. Até os seis anos, quando começa a educação fundamental, as crianças não têm capacidade de abstração: entendem o que veem e tocam, têm memória sensorial. Por isso é importante preencher a vida dos pequenos com muita realidade. A criança fica curiosa em relação à realidade, mas quando é bombardeada pelos conteúdos visuais rápidos e frenéticos das telas, ficam viciadas e se entediam diante de outros estímulos. Deixam de se interessar pela realidade, que é lenta.
Sem sentido, não há atenção
Estamos perdendo o sentido do por quê e do para quê na educação. Um exemplo real: em uma escola, a professora pediu aos alunos que fizessem um desenho dos pais. Uma aluna se recusou. Quando perguntada sobre o motivo, contou que os pais eram cegos. A professora sugeriu colocar relevo para que eles pudessem sentir o desenho. A menina se entusiasmou: havia encontrado sentido na atividade e pôde focar a atenção no que fazia.
Brincadeira desestruturada é fundamental
A brincadeira desestruturada dá condições à criança protagonizar o que está fazendo. Estudos demonstram que esse tipo de atividade é o modo privilegiado de desenvolver funções executivas como atenção, autocontrole, planejamento, memória de trabalho e flexibilidade cognitiva. Muitos dizem que as crianças de hoje não são mais como as de antigamente. Mas elas não mudaram. O que mudou foi o entorno. Crianças nascem com a qualidade inata de descobrir, mas vivem em um mundo com mais telas do que janelas. O ritmo frenético entorpece a curiosidade.
Diego Padgurschi/Estúdio Folha | ||
Catherine reiterou que a atenção é um ponto fundamental da educação infantil e desmistificou o que chamou de "neuromitos" |
Os "neuromitos" são os grandes inimigos da atenção
Os neuromitos sãs as más interpretações da literatura em neurociência. Por exemplo, não é verdade que os primeiros três anos são críticos e que é preciso enriquecer o meio ambiente das crianças nesse período para dar-lhes condições de desenvolver-se bem. Estudos recentes em neurociência confirmam que não existem períodos críticos e que não é necessário estimular demais os bebês. Os pais podem relaxar, não precisam virar animadores de auditório. Muitos professores falam que os pais solicitam que estimulem seus filhos. De onde vem essa obsessão? De uma ignorância: da ideia de que a criança com menos de seis anos precisa de ensino formal. Não precisa. É mais importante que ela desenvolva a capacidade de atenção, controle interno, tranquilidade.
Multitarefa é inimiga da atenção
Estudos dizem que não é possível fazer, ao mesmo tempo, duas coisas que exijam processamento de informação. Quando tenta fazer isso, a pessoa oscila o foco das atividades que está desenvolvendo e isso produz mais superficialidade de pensamento, mais erros e menos capacidade de definir relevância. Por isso nossos adolescentes - não todos - são "apaixonados pela irrelevância".
Prestar atenção com nossos filhos/alunos
Trata-se da "atenção conjunta". A criança vê um objeto e, antes de olhar para ele, presta atenção em como seu principal cuidador olha para aquele objeto. Se olha com interesse, a criança se interessa. A criança replica o padrão de atenção dos pais. Olham para eles cem vezes por dia para conseguir entender o mundo.