Avanços aumentam precisão e salvam vidas

Na Universidade Johns Hopkins, nos EUA, a primeira cirurgia com utilização de realidade aumentada ocorreu em junho de 2020

Imagem colorida mostra homem com óculos de realidade virtual na cabeça

Médicos já utilizam óculos de realidade virtual para analisar órgãos e diagnosticar doenças de forma mais precisa Shutterstock / PopTika

O metaverso já começou a ser utilizado na medicina em diversos hospitais, empresas e universidades. Um exemplo recente ocorreu em agosto, no Rio de Janeiro, quando foi realizada a última de uma série de cirurgias para separar os irmãos gêmeos Arthur e Bernardo Lima, que nasceram em 2018 unidos pelo crânio.

Para reduzir os riscos, os profissionais envolvidos no processo utilizaram projeções de realidade virtual da imagem dos gêmeos, feitas com base em tomografias computadorizadas e ressonâncias magnéticas, para planejar e discutir a intervenção. Foram sete cirurgias – a última delas totalizando mais de 27 horas de trabalho – envolvendo quase cem médicos.

Antes da última etapa, os médicos brasileiros se juntaram a especialistas da Inglaterra para discutir o caso, definir o melhor caminho e planejar a cirurgia final na plataforma interativa. Com a tecnologia, apenas um profissional da equipe britânica precisou vir ao Brasil, o que possivelmente nem seja mais necessário no futuro.

O caso foi definido por Noor ul Owase Jeelani, fundador da instituição de caridade Gemini Untwined, que financiou o processo, como a primeira vez em que cirurgiões que estavam em países diferentes operaram juntos em uma mesma sala de realidade virtual. "Essas operações são consideradas as mais difíceis do nosso tempo, e fazer uma delas em realidade virtual era realmente coisa da era espacial", disse ele à imprensa.

Na Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, a primeira cirurgia com utilização de realidade aumentada ocorreu em junho de 2020. No procedimento, neurocirurgiões utilizaram um fone de ouvido equipado com um visor transparente que projetava imagens da anatomia interna do paciente para oferecer uma "visão raio X" detalhada de ossos e outros tecidos. No primeiro procedimento, os médicos colocaram seis parafusos na coluna vertebral de um paciente para aliviar a dor crônica que ele tinha nas costas. Na segunda cirurgia, realizada dias depois, os cirurgiões removeram uma lesão maligna da medula espinhal de outro paciente.

Usar a realidade aumentada na sala de cirurgia é como ter um navegador GPS na frente dos olhos de forma natural. Não precisa mais olhar para uma tela separada para ver a tomografia computadorizada de seu paciente.

Timothy Witham

diretor do Laboratório de fusão Espinhal da John Hopkins Neurosurgery

"Usar a realidade aumentada na sala de cirurgia é como ter um navegador GPS na frente dos olhos de forma natural. Não precisa mais olhar para uma tela separada para ver a tomografia computadorizada de seu paciente", afirmou Timothy Witham, diretor do Laboratório de Fusão Espinhal da Johns Hopkins Neurosurgery.

Em abril de 2021, as empresas Medtronic e Surgical Theatre anunciaram uma parceria para criar uma plataforma que utiliza tecnologia de realidade aumentada SyncAR e o sistema de navegação cirúrgica StealthStation S8 para permitir que neurocirurgiões possam visualizar estruturas internas do cérebro, testar ferramentas cirúrgicas virtuais e treinar cirurgias antes de entrar na sala de procedimento.

Valelembrar que os tratamentos de tumores cerebrais, aneurismas e condições neurológicas estão entre os procedimentos cirúrgicos mais arriscados e complexos da medicina e que o acesso em tempo real a informações mais detalhadas do paciente, como o espaço entre estruturas vasculares, artérias e localização da matéria branca, é crítico. "Em neurocirurgia, é primordial identificar e navegar corretamente nas estruturas críticas do cérebro", diz o neurocirurgião Thomas Steineke, presidente do JFK Neurosciences Institute. "A visualização melhorada da realidade aumentada em interface com a StealthStation ajuda a alcançar os melhores resultados possíveis para os pacientes", afirma.

Tratamento de distúrbios e dores

Além de cirurgias, novas tecnologias vêm sendo prescritas para tratar pacientes que sofrem de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), distúrbios do sono e dores crônicas, por exemplo. Nos Estados Unidos, em junho de 2020, a Food and Drug Administration (FDA) autorizou a comercialização do primeiro dispositivo terapêutico digital apoiado em jogos para melhorar a função da atenção em crianças com TDAH. "O dispositivo EndeavorRx oferece uma opção sem drogas que melhora os sintomas associados à TDAH em crianças", disse Jeffrey Shuren, diretor do Centro de Dispositivos e Saúde Radiológica da FDA.

Em novembro do mesmo ano, a FDA autorizou a comercialização do Nightware, aplicativo destinado à redução temporária de distúrbios do sono em adultos de 22 anos ou mais. Por meio do Nightware, os sensores do Apple Watch monitoram o movimento do corpo e os batimentos cardíacos do paciente durante o sono. Os dados são enviados para o servidor do app, que utiliza um algoritmo para criar o perfil de sono daquela pessoa. Quando o Nightware detecta que ela está tendo um pesadelo, por meio da análise do seu ritmo cardíaco e movimento do corpo, ele faz o Apple Watch vibrar.

"Dormir é uma parte essencial da rotina diária de uma pessoa", afirma Carlos Peña, Ph.D., diretor do Escritório de Dispositivos Neurológicos e de Medicina Física do Centro de Dispositivos e Saúde Radiológica da FDA. "É uma nova opção de tratamento de baixo risco que utiliza a tecnologia digital em um esforço para proporcionar alívio temporário de distúrbios do sono relacionados a pesadelos", declarou.

Treinamento mais realista

Novas tecnologias também vêm sendo utilizadas para treinar médicos e estudantes de medicina pelo mundo afora. A UConn Healt, de Connecticut, e a PrecisionOS, empresa de software médico que oferece experiências interativas de RV para treinamento cirúrgico, por exemplo, utilizam a tecnologia Oculus para treinar residentes de cirurgia ortopédica usando headsets Oculus Quest que permitem que eles acessem visualmente operações cirúrgicas em 3D, como colocar alfinetes em ossos quebrados, e para que avaliem a melhor abordagem para determinada fratura. Como o programa é executado virtualmente, o sistema permite que os alunos cometam erros e obtenham feedback imediato do corpo docente.

Também há exemplos no Brasil. A MedRoom é uma edtech focada nodesenvolvimento de aplicações e experiências para simulação e treinamento em saúde com realidade virtual. Ela tem um dos mais completos modelos do corpo humano em 3D do mundo e usa realidade virtual para possibilitar uma experiência mais profunda e interativa do aprendizado.

No seu laboratório de anatomia humana em realidade virtual, os alunos podem estudar o corpo humano, explorar cada estrutura e isolar órgãos e sistemas. No treinamento de reanimação cardiopulmonar, por exemplo, a simulação permite que os estudantes vivenciem um caso de emergência no qual o personagem virtual sofre uma parada cardiorrespiratória e precisa de socorros imediatos. Segundo a empresa, a simulação é uma integração entre um manequim de RCP que se conecta com a realidade virtual por meio de software e sensores. Durante o procedimento, o aluno pode aplicar a massagem respiratória e acompanhar, em tempo real, a reação do paciente.