Maior projeto de mobilidade do governo do estado de São Paulo, o Trem Intercidades, que vai ligar São Paulo a Campinas em uma hora, com uma parada em Jundiaí, tem investimento previsto de R$ 11 bilhões, a ser dividido entre iniciativa privada e governo. O modelo será de concessão.
"O projeto ligará as zonas metropolitanas de São Paulo, Jundiaí e Campinas para permitir o movimento pendular de passageiros entre elas, que são quase conurbadas", diz Isadora Cohen, secretária-executiva da STM (Secretaria de Transportes Metropolitanos) e criadora do Infracast, podcast sobre infraestrutura. Cohen foi uma das participantes do seminário Desafios da Mobilidade no Estado de São Paulo, uma parceria entre o Estúdio Folha e o governo do Estado de São Paulo.
Além da viagem expressa, a obra engloba uma modalidade paradora, como são chamadas as composições com embarque e desembarque de passageiros em mais estações. Saindo de São Paulo, haverá paradas em Francisco Morato, Campo Limpo Paulista, Várzea Paulista, Louveira, Jundiaí, Vinhedo e Valinhos.
A ideia é aproveitar a estrutura já existente, que liga São Paulo a Jundiaí e transporta, em média, 200 mil pessoas por dia. Com o novo trem, o número tende a dobrar.
Este será o primeiro dos expressos intercidades contemporâneos. Segundo Cohen, tanto o atual governador, Rodrigo Garcia (PSDB), quanto o próximo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), têm interesse em viabilizar iniciativas similares entre outras cidades. "Aprenderemos com esse projeto para quem sabe replicá-lo e torná-lo mais comum", afirma. As passagens para o serviço expresso devem custar, no máximo, R$ 64. "O futuro concessionário poderá escolher cobrar uma tarifa mais atrativa. Ele vai estudar a demanda conforme a experiência for acontecendo", diz a secretária.
A previsão é que o edital do trem Intercidades seja publicado nos primeiros cem dias do ano que vem. A modelagem do empreendimento já está bem encaminhada. De acordo com Cohen, o estado de São Paulo está "com a saúde em dia do ponto de vista fiscal, orçamentário, estrutural e técnico" para tocar o projeto, com espaço de endividamento de R$ 15 bilhões.
Joubert Flores, presidente nacional da ANPTrilhos (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos) defende a valorização do transporte ferroviário e acha que, com esse tipo de projeto, o estado pode virar exemplo para o Brasil. Ele chama atenção para o fato de, hoje, haver apenas dois trens intercidades no país, sem considerar os turísticos. Ambos são operados pela Vale. Um liga Belo Horizonte (MG) a Vitória (ES), e o outro, São Luís (MA) a Parauapebas (PA).
Os ramais transportam cerca de 1,3 milhão de passageiros por ano. Segundo Joubert Flores, na década de 1960, o número de usuários da rede ferroviária brasileira chegava a 89 milhões anualmente.
"A gente fugiu da razoabilidade apostando num único modal [o transporte rodoviário]. Isso fica claro em episódios como a greve dos caminhoneiros. Nós temos 27 zonas metropolitanas com mais de 1 milhão de pessoas no Brasil e apenas 1.105 km de trilhos urbanos. É ótimo ter a rodovia e a indústria automotiva, mas isso não era razão para erradicar os tens", afirma.
Segundo ele, há 70 projetos, com 3.000 km de linhas, que poderiam ser desenvolvidos. "A dificuldade é o investimento. Em infraestrutura ele é a longo prazo. Não pode ser de governo, mas de estado. São Paulo é exemplo. Essa linha e outras que virão estimularão outras unidades a fazer também", diz.
O painel também discutiu o financiamento do transporte público dentro e fora das cidades. Para Ciro Biderman, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e diretor do FGV Cidades, uma das formas de financiamento para o Metrô e para a CPTM é a venda das terras nos arredores das estações, as chamadas faixas lindeiras, de propriedade das estatais. Ciro defende o modelo chamado "mergulhão", no qual as composições de superfície também têm trechos subterrâneos.
"Se eu ‘mergulho’ o trem, essa terra vira terra em espaço nobre", diz. O professor foi enfático ao criticar a ideia de haver passe livre nos ônibus de São Paulo, possibilidade aventada pelo prefeito, Ricardo Nunes (MDB). "Espero que essa medida populista não vá adiante.
Como política distributiva de renda é muito ruim, porque não é focada, já que 100% das pessoas receberiam esse desconto", diz Biderman. Joubert Flores afirma que, como representante de uma associação, não cabe a ele dizer se é a favor ou contra a política, mas pondera que, se o benefício for dado apenas para um modal, esse meio de transporte vai acabar sobrecarregado.
Já Isadora Cohen chamou a atenção para a forma como se dá a remuneração das concessionárias, o que teria de ser revisto se a gratuidade nos ônibus acontecer. "Tudo que o usuário de transporte sobre trilhos (trem e metrô) e pneus (ônibus) paga para transitar vai para uma conta de arrecadação que alimenta todo o sistema, que é equilibrado. Se fosse aprovada a tarifa zero, teria de haver um reequilíbrio", afirma.