Lei é avanço, mas desigualdades regionais precisam ser superadas

Expansão do Programa Nacional de Triagem Neonatal exige especialistas, tecnologia e centros de referência em todas as regiões do Brasil

Painel 2, “Ampliação da Triagem Nenonatal - Estamos Prontos?”

Painel 2, Ampliação da Triagem Nenonatal - Estamos Prontos?” MASAO GOTO FILHO

A implementação da lei do Teste do Pezinho Ampliado depende da criação de uma estrutura que possibilite diagnósticos precisos e o tratamento dos casos confirmados das doenças. Mas o primeiro passo já foi dado com a aprovação da lei 14.154, no ano passado. Essa foi a principal conclusão dos especialistas que participaram do painel "Ampliação da triagem neonatal – Estamos prontos? (assista abaixo)."

"A ampliação da triagem neonatal é o meio mais efetivo de oferecer às famílias a possibilidade de os seus filhos terem diagnóstico precoce para doenças de impacto profundo no desenvolvimento. Isso vai fazer toda a diferença na busca de tratamentos adequados e de mais qualidade de vida", afirma a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), que gravou um depoimento para reforçar a importância do programa e de debates como o protagonizado pelo Fórum Estúdio Folha Triagem Neonatal.

"Nesse sentido, a lei 14.154/2021 representa um avanço importantíssimo: ela amplia a cobertura do Teste do Pezinho para mais de 50 doenças, incluindo a Atrofia Muscular Espinhal (AME), que é a maior causa genética de mortalidade infantil no Brasil. Dependendo do gestor, o número de doenças rastreadas pode ser ainda maior", completa Mara, que é presidente da Comissão de Doenças Raras.

A lei foi aprovada por unanimidade na Câmara dos Deputados e no Senado. "Conseguimos convencer o Ministério da Saúde que o custo de investir em prevenção seria menor do que as despesas com internações e tratamentos das doenças diagnosticadas tardiamente. Sem falar na melhora da qualidade de vida dos pacientes", diz o deputado federal Dagoberto Nogueira (PDT-MS), autor do projeto, que participou virtualmente do fórum.

Ele afirma que existem mais de 30 mil laboratórios habilitados a fazer o Teste do Pezinho em todo o país. "Ainda é pouco: precisamos credenciar mais laboratórios. É um grande desafio levar esse teste ampliado a todas as regiões do Brasil, mas vamos trabalhar para que isso aconteça."

Dra. Ida Schwartz, geneticista
Dra. Ida Schwartz, geneticista - MASAO GOTO FILHO

Eliane Santos, assessora técnica de saúde da APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) Brasil, ressalta que um dos principais desafios para a implantação da lei começa no momento ideal de coleta do Teste do Pezinho —entre o terceiro e o quinto dia de vida do bebê.

"Temos casos de sucesso, como São Paulo, Brasília e Paraná, que colhem o teste ainda na maternidade, e isso muda o curso da doença e do tratamento. Mas, em outros estados, é comum a mãe e o bebê terem alta depois de 24 horas do parto. Será que, com a introdução da espectometria de massas, poderíamos fazer esse teste um pouco antes, ainda na maternidade?", questiona.

Eliane Santos, assessora técnica de saúde da APAE Brasil
Eliane Santos, assessora técnica de saúde da APAE Brasil - MASAO GOTO FILHO

A espectometria de massas é uma tecnologia de alta sensibilidade e confiabilidade que permite detectar cerca de 40 distúrbios metabólicos hereditários a partir do sangue coletado em papel filtro. Fundamental para o Teste do Pezinho Ampliado, está sendo incorporada ao Programa Nacional de Triagem Neonatal.

"Com a evolução da triagem neonatal conseguimos desenvolver métodos mais precisos de detecção, o que dá mais segurança para o programa de triagem e para o paciente", afirma Michel David, representante da PerkinElmer, empresa responsável por 90% dos testes neonatais realizados no mundo.

Michel David, representante da PerkinElmer
Michel David, representante da PerkinElmer - MASAO GOTO FILHO

Os testes feitos em papel filtro devem ser encaminhados o quanto antes para análise em laboratório, para acelerar o diagnóstico e o início do tratamento. A demora nesse transporte é ponto de atenção, alertam os participantes do fórum, assim como a falta de especialistas, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. Por isso, uma das sugestões apresentadas no fórum é que o Ministério da Educação viabilize a formação desses profissionais em todas as regiões do país.

Outra necessidade apontada é a criação de centros de referência nacionais. "Precisamos construir essa estrutura e tentar amenizar as diferenças regionais, com a participação dos ministérios da Saúde e da Educação. Mas a ampliação tem que começar imediatamente: não podemos esperar a estrutura estar pronta", conclui a assessora da APAE.

Senadora Mara Gabrilli
Senadora Mara Gabrilli - MASAO GOTO FILHO

A geneticista Ida Schwartz, professora associada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), defende a necessidade de diálogo entre a Atenção Primária à Saúde e o atendimento de média e alta complexidade.

"Os 30 mil pontos de coleta do Teste do Pezinho Ampliado fazem parte da rede primária, estão nas UBS (Unidades Básicas de Saúde). Mas as doenças diagnosticadas são raras e complexas: não tem como deixar o atendimento só na atenção primária", afirma.

Ela explica que a coleta do Teste do Pezinho é simples, mas a etapa seguinte envolve procedimentos complexos. "É uma tecnologia avançada, com tratamentos que muitas vezes envolvem altos custos. E o Ministério da Saúde tem regras bem específicas para cada caso. É preciso haver um diálogo de uma ponta com a outra", completa.

Deputado Federal Dagoberto Nogueira  e Deputada Federal Marina Santos
Deputado Federal Dagoberto Nogueira e Deputada Federal Marina Santos - MASAO GOTO FILHO

Segundo Michel David, da PerkinElmer, a empresa tem todo o interesse em colaborar para o desenvolvimento de programas como o PNTN. "Nosso papel como indústria diagnóstica é fornecer alta tecnologia de uma maneira simples, acessível e economicamente viável."

A deputada federal Marina Santos (Republicanos-PI), relatora da lei 12.154, afirma que a aprovação do projeto representa um grande avanço. "O primeiro passo foi tornar a triagem obrigatória. Agora temos um longo caminho a percorrer, que é romper barreiras e vencer cada um dos desafios citados." A deputada participou virtualmente do fórum.

Ela ressaltou a importância de a sociedade civil também ajudar no cumprimento da lei. "O Teste do Pezinho ampliado é lei e o município é obrigado a fazê-lo. As instituições de controle estarão fiscalizando; a população e as ONGs também podem fiscalizar e denunciar."

O deputado Dagoberto destaca a relevância do papel da imprensa ao tornar pública a discussão sobre a importância da ampliação do Teste do Pezinho. "É fundamental que a população entenda que tem direito ao teste e cobre do município, se preciso recorrendo ao Ministério Público, para que o Ministério da Saúde viabilize a execução da lei."

Material destinado ao público geral. BR-25405 Dez/22.