A campanha nacional de imunização contra a gripe segue até o dia 9 de julho e, um mês antes do encerramento, apenas aproximadamente 55% das crianças alvo (entre 6 meses e seis anos) foram vacinadas1. Na campanha deste ano elas foram o primeiro grupo da campanha, ao contrário dos anos anteriores, que iniciava com a população acima de 60 anos.
Vale lembrar que, mesmo se a data do grupo prioritário já tenha passado, ainda é possível ser imunizado. Após o prazo final da campanha isso também será possível. Para a população que não é priorizada na campanha do PNI, a vacina pode ser encontrada em clínicas particulares.
No ano passado, a vacinação contra influenza foi bastante exitosa entre os mais velhos, que tiveram o melhor desempenho e atingiram 119,72% de cobertura vacinal, segundo dados do Ministério da Saúde. A meta do governo é vacinar 90% de todos os grupos prioritários2. Já a população pediátrica ficou aquém, com 63,92%.
Esses dados indicam que a percepção da importância da vacinação contra a gripe na população de idosos já está bastante consolidada, mas ainda é necessário difundir a importância de vacinar as crianças contra o vírus influenza.
"Apesar de não ser o principal grupo em número de óbitos, as crianças são bastante afetadas, são as que mais adoecem e fazem a procura por consultas de emergência e ambulatoriais dispararem", explica a pediatra Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).
Existem dois tipos de vírus principais: influenza A (exemplo H1N1 e H3N2 mais prevalentes) e o influenza B (que tem duas linhagens principais B/Yamagata e B/Victoria). Os dois tipos de vírus circulam nos meses mais frios, mas podem circular o ano todo, em especial o tipo B.6,7
As linhagens do tipo B são as que costumam acometer as crianças e as taxas da temida Síndrome Respiratória Aguda (SRAG) causada por ela são mais altas em crianças de até cinco anos, segundo dados brasileiros de 2013 a 20188.
Além disso, os pequenos são quem mais transmitem o vírus, contaminando os adultos no entorno, sejam eles familiares ou professores. Adultos saudáveis que contraem gripe eliminam o vírus de 24h a 48h antes dos sintomas serem detectados e, em geral, em taxas bem mais baixas no período sintomático, com picos nas primeiras 24h a 72h da doença3.
Já em crianças, o vírus começa a ser disseminado antes e por período mais longo após os sintomas. Há registro clínico de crianças que seis dias antes já estavam contagiosas, e outras que continuaram com o vírus influenza 21 dias depois3.
Isabella Ballalai destaca que essa característica faz com que o benefício da imunização se estenda para outros grupos e exemplifica: "Há um estudo sobre o impacto da vacinação em massa de crianças e adolescentes no Japão que levou a uma redução drástica de casos entre os idosos".
Publicado no "The New England Journal of Medicine", o estudo mostra que uma robusta cobertura vacinal na idade escolar preveniu entre 37 mil e 49 mil mortes por ano, ou para cada 420 crianças vacinadas1 morte foi evitada4.
Apesar disso, desde 2017, o Brasil não consegue chegar na meta estabelecida para o grupo de crianças entre 6 meses e 6 anos, o que preocupa a vice-presidente da SBIm.
"É uma doença para a qual existe vacina para a população pediátrica. Doença que pode abrir concorrência por leitos de ambulatório e de UTI, com potencial de causar mortes e levar a uma tragédia ainda maior do que a que estamos vivendo. Além disso, no atual cenário, qualquer sintoma sugestivo de Covid-19, similar aos da gripe, haverá uma recomendação de quarentena, no mínimo, por dez dias. É um grande estresse para confirmar o diagnóstico e abala toda a estrutura familiar, já que a criança vai deixar de ir à escola e, muitas vezes, os pais não têm com quem deixar os filhos", afirma a pediatra.
Uma forma de aumentar o número de crianças imunizadas contra a gripe é a exigência da carteirinha de vacinação no ato da matrícula escolar. Pesquisa qualitativa feita pelo Unicef, no ano passado, listou essa obrigatoriedade como um motivo que levaria os pais a vacinar os filhos5.
"Na rede pública de ensino é mais comum pedir a carteira, mas não na particular. O melhor é que as escolas comuniquem mais sobre a importância de se vacinar as crianças."
Referências
1. Ministério da Saúde. Campanha Nacional de Vacinação Contra a Influenza 2021. Disponível em https://qsprod.saude.gov.br/extensions/Influenza_2021/Influenza_2021.html Acesso em 9/6/2021
2. Ministério da Saúde. Campanha contra gripe supera meta de vacinação do público-alvo. Disponível em https://www.gov.br/pt-br/noticias/saude-e-vigilancia-sanitaria/2020/07/campanha-contra-gripe-supera-meta-de-vacinacao-do-publico-alvo
3. World Health Organization Writing Group et al. “Non-pharmaceutical interventions for pandemic influenza, international measures.” Emerging infectious diseases vol. 12,1 (2006): 81-7. doi:10.3201/eid1201.051370
4. Reichert, T A et al. “The Japanese experience with vaccinating schoolchildren against influenza.” The New England journal of medicine vol. 344,12 (2001): 889-96. doi:10.1056/NEJM200103223441204. Disponível em https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/nejm200103223441204#article_references.
5. Unicef. Estudo qualitativo sobre os fatores econômicos, sociais, culturais e da Política de Saúde relacionados à redução das coberturas vacinais de rotina em crianças menores de cinco anos. Disponível em https://www.unicef.org/brazil/media/11001/file/estudo-fatores-relacionados-reducao-coberturas-vacinais-de-rotina-em-criancas-menores-5-anos.pdf
6. Ministério da Saúde. Informe epidemiológico. Disponível em https://antigo.saude.gov.br/images/pdf/2019/dezembro/23/Boletim-epidemiologico-SVS-38-2-interativo.pdf
7. Ministério da Saúde. Informe epidemiológico. Disponível em https://antigo.saude.gov.br/images/pdf/2019/dezembro/23/Boletim-epidemiologico-SVS-38-2-interativo.pdf
8. Ministério da Saúde. Informe Técnico: 20ª Campanha Nacional de Vacinação contra a Influenza. Disponível em: https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2018/abril/18/Informe-Cp-Influenza---01-03-2018-Word-final-28.03.18%20final.pdf
MAT-BR-2103346