É preciso cuidar do planeta e do ser humano

Estudos recentes e cientistas de todo o mundo alertam que não existe um plano B: governos, empresas e sociedade precisam agir agora para evitar o colapso e garantir o futuro das próximas gerações

Incêndio de grandes proporções nas florestas da Califórnia vêm se tornando cada vez mais frequentes

Incêndio de grandes proporções nas florestas da Califórnia vêm se tornando cada vez mais frequentes Shutterstock

Terra: O Planeta Importa

O DIA DA TERRA, 22 DE ABRIL, FOI CRIADO PARA QUE TODOS PAREM E PENSEM SE ESTÃO FAZENDO O MELHOR PARA GARANTIR QUE ESSA QUASE ESFERA DE MAIS DE 4 BILHÕES DE ANOS CONTINUE A SER A CASA IDEAL PARA A ESPÉCIE HUMANA. AINDA HÁ MUITO A FAZER, MAS CRESCE A CONSCIÊNCIA DE QUE O PLANETA IMPORTA PORQUE A HUMANIDADE (QUE DEPENDE DELE) IMPORTA.

O físico Paulo Artaxo, um dos cientistas mais respeitados do mundo quando o assunto é a física das mudanças climáticas, tem uma posição equilibrada sobre a situação atual do planeta Terra. "Não é catastrófico e nem o fim do mundo, mas a ciência vem mostrando claramente que é preciso encontrar uma nova maneira de lidar com os recursos naturais do planeta", costuma dizer o pesquisador da USP (Universidade de São Paulo). ​

O raciocínio de quem se debruça sobre a questão climática é até simples: não existe um plano B. Cuidar do planeta é, por consequência, cuidar da casa das futuras gerações. Por isso que a nova mentalidade a favor da sustentabilidade, algo que na prática é discutido em ambientes como o das Nações Unidas há mais de 50 anos, precisa realmente atingir a toda a sociedade, desde o cidadão comum até os grandes CEOs de grupos transnacionais.

O tema vem rapidamente ganhando espaço no setor privado, com cada vez mais empresas se conscientizando e agindo para ampliar e implementar iniciativas que envolvam a questão ambiental em seus negócios. Muitas dessas ações são aceleradas pela demanda criada pelos próprios consumidores, mais críticos e conscientes. O Fórum de Davos realizado em 2021, em plena pandemia, foi um grande ponto de virada no discurso do setor privado. Desde então, várias iniciativas internacionais estão focadas em melhorar a qualidade de vida do planeta.

Ao mesmo tempo, cientistas continuam a trabalhar no levantamento de dados e na compreensão do momento em que vivemos. No início do mês, um novo relatório do IPCC, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (Organização das Nações Unidas), elaborado por várias centenas de pesquisadores de todos os cantos do mundo de forma voluntária, balizou bem qual precisa ser o plano a partir de agora.

"Para que a humanidade tenha uma chance maior do que 50% de manter o aquecimento da Terra no limite de 1,5ºC preconizado pelo Acordo de Paris – que nos afasta de um futuro com mais incêndios, estiagens, tempestades, inundações e nevascas, por exemplo – , será preciso que as emissões de gases de efeito estufa cheguem ao pico em algum momento dos próximos três anos e caiam 43% até 2030. Na última década, elas subiram 12%", alerta o estudo.

"Não é o fim do mundo, mas é preciso encontrar uma nova forma de lidar com os recursos do planeta"

Paulo Artaxo, físico e pesquisador da USP

Aos níveis atuais de crescimento, as emissões de gases de efeito estufa provavelmente resultarão no dobro de aquecimento, alcançando 3,2°C até 2100.

Os cálculos do Observatório do Clima, uma rede que representa as cabeças pensantes do terceiro setor brasileiro, mostram o tamanho do desafio. Tanto que António Guterres, secretário geral da ONU, não evitou um tom mais assertivo em seu discurso que marcou o lançamento do novo documento.

"Essa é uma emergência climática. Não estão apenas fechando os olhos, eles estão adicionando combustível às chamas. Eles estão sufocando nosso planeta, com base em seus interesses e investimentos históricos em combustíveis fósseis, quando soluções mais baratas e renováveis geram empregos verdes, segurança energética e maior estabilidade de preços", afirmou o dirigente português durante sua fala, claramente direcionada para os governantes dos países que ainda insistem em olhar para o retrovisor e, mais precisamente, para a energia gerada a partir dos combustíveis fósseis.

Cada vez mais intensas, nevascas atingiram com força o Texas (EUA) em 2021
Cada vez mais intensas, nevascas atingiram com força o Texas (EUA) em 2021 - Shutterstock

Assim como o IPCC dá a real dimensão da crise climática, e de como é importante que todos se voltem para cuidar do planeta, o grupo de cientistas que escreveu milhares de páginas nos últimos meses dá pistas sobre quem está fazendo a lição de casa com um pouco mais de empenho.

O documento indica que ao menos 18 países desde o Protocolo de Kyoto, acordo para o corte de emissões assinado em 1997 na cidade japonesa, vêm reduzindo de forma consistente as emissões de gases estufa há mais de dez anos.

Apesar de o texto não citar os nomes das nações, a agência AP resolveu fazer a lista, com base em dados compilados por projetos internacionais que investigam o tema. O levantamento mostra que 19 nações emitiam em 2019 – portanto antes da pandemia – 10 milhões de toneladas métricas a menos do que estava sendo lançado para a atmosfera em 2010. A maioria – Reino Unido, Alemanha, Itália, Ucrânia, França, Espanha, Grécia, Países Baixos, Finlândia, Dinamarca, República Tcheca, Bélgica, Polônia, Romênia e Suécia – está na Europa. Fecham o grupo, EUA, Japão, México e Singapura.

A boa notícia é que existem soluções para que todos os países possam reduzir, e de forma significativa, suas emissões. As tecnologias de mitigação disponíveis atualmente são suficientes para reduzir as emissões pela metade até 2030. Cerca de 50% dessas soluções podem ser implantadas por menos de US$ 20 por tonelada.

"Soluções renováveis e baratas geram empregos verdes, segurança energética e estabilidade de preços"

António Guterres, secretário geral da ONU

O Brasil se encaixa no quebra-cabeça climático tanto do ponto de vista positivo quanto do negativo. O lado bom é que o país tem uma matriz energética limpa, por causa da geração das hidrelétricas e do crescimento das energias eólica e solar. Em dez anos, o preço desse tipo de geração caiu mais de 50%.

O Plano Decenal de Expansão de Energia do Ministério das Minas e Energia aponta que a capacidade energética do país deve subir de 200 GW para 275 GW em 2031. Com essa expansão, a participação das fontes renováveis na geração de energia deve ficar acima dos 80%. Hoje, a média mundial é de 27%. Por isso o recado do secretário-geral da ONU ter sido direcionado para quem ainda aposta alto nos derivados do petróleo como fonte energética.

Entretanto, para que o Brasil possa ser visto do lado positivo da história climática, como reforçam especialistas no tema, a grande questão a ser resolvida é o desmatamento de biomas como a Amazônia e o Cerrado. Em todo o mundo, o aumento na eficiência da agropecuária e a redução do desmatamento têm o potencial, segundo o IPCC, de reduzir as emissões de 14 bilhões de toneladas de carbono por ano até 2050, a um custo relativamente baixo, ou menos de US$ 100 por tonelada. Isso praticamente já resolveria parte do problema.

De acordo com Mercedes Bustamante, da Universidade de Brasília e autora de um dos capítulos do relatório do IPCC, a agricultura, a floresta e a mudança do uso da terra contribuem para 22% das emissões globais. "O setor pode remover carbono da atmosfera em grande escala e ainda beneficiar a biodiversidade e as seguranças alimentar e hídrica", afirma.

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