Economia circular é essencial para a evolução das empresas

Mais consciente, consumidor cobra adoção de processos que buscam eliminar o desperdício e garantir uso seguro e contínuo dos recursos naturais; prática também afeta positivamente desempenho dos negócios

Quando se observa gigantes mundiais dos mais diversos segmentos caminharem em uma mesma direção, pode-se dizer que algo está, de fato, mudando na velha ordem mundial. O objetivo desse movimento é um só: a adoção de políticas e ações efetivas que consolidem e disseminem cada vez mais o processo de economia circular. E engana-se quem vê nisso apenas uma questão de marketing. Tem a ver com sobrevivência, do negócio e do planeta.

Ao promover a eliminação do desperdício e o uso seguro e contínuo dos recursos naturais cada vez mais em xeque com o crescimento da população mundial – que deve chegar a 9,7 bilhões até 2050, segundo a ONU –, a economia circular sinaliza a possibilidade de interações mais benéficas e responsáveis entre seres humanos, empresas e meio ambiente.

Na ponta do lápis, ela também melhora o desempenho financeiro das companhias, já que, segundo dados do Fórum Econômico Mundial, pode render até US$ 4,5 trilhões em benefícios econômicos até 2030.

O novo modelo se contrapõe à economia tradicional linear, que é baseada na prática de produzir-utilizar-descartar e atrela o crescimento econômico à necessidade contínua de consumo de artigos altamente descartáveis. Na economia circular, os pilares são produção e consumo responsáveis, com o prolongamento da vida útil de materiais e produtos por meio de compartilhamento, reutilização, reparação e reciclagem.

Para cumprir a missão, o novo modelo trabalha a ideia do "próximo uso" desde a concepção, levando em conta aspectos como design e material utilizado. De forma geral, a ideia é que tanto matéria-prima quanto produtos entrem em ciclos de reutilização e reciclagem. Produtos são concebidos para durar e serem compartilhados, reutilizados, ou revendidos até o final da sua vida útil quando seus materiais iniciam o mesmo tipo de ciclo e são reutilizados na linha de produção, reciclados ou, quando não há outra possibilidade, descartados da forma mais responsável e inofensiva possível.

Um exemplo recente é o da JBS, maior empresa de alimentos à base de proteína do mundo. No mês de março, ela anunciou que vai destinar cerca de 25% do volume de resíduo orgânico de suas operações para a composição da matéria-prima que será utilizada na produção de até 150 mil toneladas de fertilizantes por ano em sua unidade em Guaiçara, no interior paulista. A iniciativa faz parte do compromisso assumido pela empresa de zerar o balanço líquido das emissões de gases causadores do efeito estufa até 2040.

O Movimento ReCiclo, da C&A, é outro modelo de economia circular. O projeto promove a coleta de roupas usadas de qualquer marca nas lojas e já arrecadou mais de 137 mil peças em todo Brasil, o equivalente a 34 toneladas de roupas. A maior parte (70%) foi destinada a reuso e o restante – apenas pelo fato de ter sido encaminhado para reciclagem e não para aterros – evitou a emissão de aproximadamente 75 toneladas de carbono equivalente na atmosfera.

A Riachuelo tem programa semelhante de coleta de roupas usadas e iniciou um projeto de circularidade fechada em parceria com o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo) para a reutilização de sobras da indústria da moda, que vão se transformar em um novo fio para a confecção de outras peças.

A Unilever Brasil já conseguiu evitar a destinação de cerca de 13 mil toneladas de plástico para aterros desde 2018, quando passou a usar material reciclado em parte de suas embalagens. A iniciativa evitou a emissão de mais de 17 mil toneladas de CO2 para o meio ambiente.

Carrefour e Klabin também criaram uma parceria para promover a coleta e a reciclagem de papel. Em menos de um ano, a iniciativa resgatou 1.600 toneladas de material que foram convertidas em embalagens de papelão.

PRESSÃO DOS CONSUMIDORES

Ao completar esses círculos, o modelo demanda menos recursos, tanto para a fabricação quanto para o descarte de produtos, causando, consequentemente, menos impacto no planeta.

Para se ter uma ideia, uma pesquisa da Ellen MacArthur Foundation indicou que 45% das emissões de gases de efeito estufa vêm da produção de carros, roupas, alimentos e outros produtos que usamos diariamente. Mostrou ainda que, se a economia circular fosse aplicada em apenas cinco áreas principais (cimento, alumínio, aço, plástico e alimentos), poderíamos eliminar quase metade das emissões provenientes da produção de mercadorias – o que significa 9,3 bilhões de toneladas de CO2 até 2050, o equivalente a eliminar completamente as emissões atuais de todo o transporte.

Esse fator ambiental obviamente é um grande motivador para empresas de diversos segmentos darem seus primeiros passos rumo à economia circular, mas não é o único. Por trás dessas iniciativas, também existe a crescente pressão dos consumidores, que cada vez mais cobram esforços e responsabilidade das marcas em relação aos impactos que sua atuação gera para o planeta.

Estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com empresários e consumidores de todo o Brasil constatou que 62% dizem já ter boicotado marcas por violação de direitos trabalhistas, maus-tratos a animais, crimes ambientais, discriminação e posicionamento político.

Uma pesquisa global da Nielsen mostrou que 81% dos consumidores acreditam que as empresas devem ajudar a melhorar o meio ambiente. De acordo com o levantamento da CNI, 88,2% dos empresários brasileiros veem a economia circular como importante ou muito importante para a indústria, e 76,5% das empresas já adotam alguma prática de economia circular.

Em relação ao consumidor, 38% dos entrevistados dizem se preocupar em saber se um item foi produzido de forma ambientalmente correta, enquanto 31% afirmam estar dispostos a pagar mais por produtos fabricados dessa maneira.

O único porém é que, embora as iniciativas e as motivações sejam muitas, a transição para esse novo modelo ainda é um desafio imenso. Segundo o Fórum Econômico Mundial, a estimativa é que atualmente apenas 8,6% do mundo seja circular. Ou seja, o caminho a percorrer ainda é longo. Mas já está sinalizado.