Descrição de chapéu câncer

Associações pedem que leis que agilizam exames e tratamentos sejam cumpridas

Legislação determina até 30 dias para realização da biópsia, em caso de suspeita de câncer, e até 60 dias após o diagnóstico para início do tratamento

Você sabe o que é a jornada de um paciente com câncer? Segundo Luciana Holtz, fundadora e presidente do Instituto Oncoguia, trata-se de um conceito que situa e organiza todas as etapas no enfrentamento de uma doença. “Ela ajuda a entender o passo a passo, mas também a identificar os principais problemas e barreiras.”

A discussão sobre a jornada ideal do paciente versus o que ele enfrenta na realidade abriu o segundo dia do 11º Fórum Nacional de Políticas de Saúde em Oncologia On-line.

Segundo Luciana, a jornada ideal começa com uma pessoa que tem o compromisso diário de manter sua saúde em ordem. Para isso, é fundamental adotar hábitos saudáveis, como praticar atividade física, ter uma alimentação saudável, controlar o excesso de peso, não fumar e realizar exames médicos periódicos de acordo com a idade.

Para os cerca de 70% da população brasileira que dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS), o acompanhamento e a manutenção da saúde devem ser feitos nas Unidades Básicas de Saúde (UBS).

Quando a pessoa percebe algum sinal ou alteração no corpo (como um caroço no seio) ou recebe o resultado de um exame alterado, ela deve ser encaminhada a um médico especialista nos Ambulatórios Médicos de Especialidades (AMEs), para avaliação ou exames complementares, como biópsia.

“A biópsia vai concluir a primeira etapa do diagnóstico, informando se o tumor é benigno ou maligno. E é importante saber se esse câncer está em estágio inicial ou avançado”, disse Luciana.

Nessa primeira parte da jornada, o destaque fica para a importância da lei dos 30 dias (n° 13.896/19). Sancionada em 2019, ela assegura a pacientes do SUS com suspeita de câncer o direito à realização de exames diagnósticos no prazo máximo de 30 dias. Essa é a teoria. Na prática, o paciente enfrenta inúmeras barreiras.

Daniele Castelo Branco, gestora da Associação Nossa Casa, explicou que essa lei foi criada para tentar diminuir o tempo entre a consulta com o especialista e a biópsia, para que os pacientes tenham acesso ao diagnóstico em tempo hábil de começar um tratamento bem-sucedido. “Mas há um gargalo enorme no SUS. O paciente passa tanto tempo entre a consulta com o especialista e a biópsia que, quando tem o diagnóstico, a doença está em estágio avançado.”

Daniele citou algumas das dificuldades enfrentadas. Se o paciente, por conta das filas na UBS, tem o resultado do exame alterado a partir de uma clínica popular, por exemplo, tem que voltar à UBS e começar o processo do zero. Outro problema é a falta de integração entre a atenção primária (UBS) e a secundária (AME). “A pandemia atrasou ainda mais essa jornada. Piorou uma realidade que já não era boa”, disse.

Vencida a etapa do diagnóstico, o primeiro tratamento (cirurgia, quimioterapia ou radioterapia) deveria ser definido de forma personalizada pelo oncologista e começar o quanto antes. “Não é o que acontece, daí a importância da lei dos 60 dias (n° 12.732/12), de maio de 2013, que garante ao paciente com câncer o direito de iniciar o tratamento no SUS em, no máximo, 60 dias após o diagnóstico da doença”, afirmou Daniele.

“A demora no diagnóstico impacta no tratamento como um todo”, disse Leoni M. Simm, socióloga e presidente voluntária da Amor e União Contra o Câncer (AMUCC). Ela listou os principais desafios do acesso ao tratamento: demora no diagnóstico, o câncer é descoberto em estágios avançados, gerando maiores gastos e menores chances de cura; erros no encaminhamento do paciente e problemas na classificação no Sisreg, o sistema de regulação do SUS para solicitação de exames e procedimentos de média e alta complexidade; falhas no acesso ao gerenciamento de filas; demora no início do tratamento de pacientes graves; e falta de medicamentos essenciais para o tratamento do câncer, gerando interrupção do tratamento.

Merula Steagall, presidente da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) e idealizadora do Movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC), finalizou a discussão lembrando da importância do empoderamento do paciente, que deve estar informado, atento e ser persistente na busca por seus direitos e para tentar acelerar os processos.